Djamila Ribeiro

Mestre em filosofia política pela Unifesp e coordenadora da coleção de livros Feminismos Plurais.

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Djamila Ribeiro
Descrição de chapéu universidade

Opará Saberes quer apoiar pessoas negras na entrada em universidades públicas

Além de ingressar, permanecer é um desafio enorme, ainda mais em um cenário de enormes cortes orçamentários

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Estamos vivendo um momento em que cortes orçamentários imensos estão sendo feitos na educação superior pelo governo federal, o que pode levar ao iminente fechamento de universidades públicas, precarização de professores e professoras, fim de bolsas de estudos, entre outras consequências.

A situação é gravíssima, mas, relembrando Darcy Ribeiro, não se trata de uma crise, e sim de um projeto. As consequências do ataque à educação pública são muitas para serem citadas aqui, mas podemos resumir dizendo que é preciso de um governo antipatriota para que esse setor vital para o desenvolvimento e a geração de empregos no país seja precarizado.

Produzir ciência é um ato complexo, sobretudo em um país com tantas desigualdades como o nosso. Para além do momento político atual, o Brasil carrega um histórico de desigualdades que afastou muitas pessoas da universidade. Eu mesma, vinda de uma família negra, fui a primeira a entrar em uma universidade. Fiz filosofia no campus da Unifesp de Guarulhos, criado como política do governo Lula de expansão das universidades públicas.

Na ilustração de fundo verde, duas mulheres negras estão ao centro dialogando. A da esquerda possui cabelos negros longos e blusa regata verde e segura uma prancheta amarela, a outra de cabelos negros presos em coque, usa uma blusa rosa com detalhes verdes e com uma caneta assina a prancheta.
Publicada nesta quinta-feira, 28 de julho de 2022 - Linoca Souza

Quando entrei na faculdade, tinha 27 para 28 anos. Foi uma luta, pois já era mãe, trabalhava em uma empresa do porto de Santos e tinha dinheiro contado. A minha história de obstáculos para estudar é uma experiência comum, afinal, são milhões de mulheres que enfrentam desafios dobrados para ingressar numa universidade e nela permanecer.

Ou ainda, para ingressar em uma pós-graduação, como foi o meu caso, aos 32 anos. Isso só foi possível graças à criação de políticas públicas na área da educação. Sou fruto da expansão das universidades públicas.

As políticas de ações afirmativas foram e são essenciais para o aumento do número de pessoas negras no ensino superior. No que se refere à graduação, a Universidade do Estado do Rio de Janeiro, a Uerj, foi a primeira a adotar cotas para a população negra, em 2001. A Universidade do Estado da Bahia, a Uneb, aderiu em 2003, e a Universidade de Brasília, UnB, em 2004.

Atualmente, por força da lei de cotas aprovada em 2012, durante a administração de Dilma Rousseff, todas as universidades federais devem reservar vagas. Importante notar que a lei faz dez anos neste ano e precisa da mobilização popular para sua continuação.

As pós-graduações ainda não estão presentes na lei de cotas federal. Um dos últimos atos da presidenta Dilma antes do impeachment foi a edição da portaria de maio de 2016 que previa que universidades federais criassem sistemas de reserva de vagas para alunos negros, indígenas e pessoas com deficiência nos mestrados e doutorados. A portaria foi revogada pelo ex-ministro Abraham Weintraub, do atual governo.

Contudo, ela teve um enorme impacto no crescimento de programas com previsão de ações afirmativas. Segundo dados do Obaap, o Observatório de Ações Afirmativas na Pós-Graduação, lançado pela pesquisadora Anna Carolina Venturini, o número de programas com ações afirmativas mais do que dobrou entre 2018 e 2021.

Contribuir para a formação de mulheres negras é um sonho feminista negro. No início do mês, Carla Akotirene, doutora em estudos de gênero pela Universidade Federal da Bahia, me contou que estava determinada a retomar o projeto Opará Saberes, que visa apoiar pessoas negras, em especial mulheres, para processos de seleção para os cursos de mestrado e doutorado em universidades públicas. Tive a honra de participar da primeira edição, em 2017, em uma formação no auditório da UFBA, e vê-lo de volta é motivo de inspiração e esperança.

O Opará Saberes vai fornecer apoio teórico, metodológico e psicológico de forma gratuita para contribuir para a aprovação e, posteriormente, na permanência nos cursos. Permanecer é um desafio enorme, ainda mais em um cenário como o descrito no início do texto.

É uma iniciativa fundamental que deve ser celebrada e merece todo o apoio. O anúncio oficial aconteceu da reedição do Opará, no dia 25 de julho, Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, e a live de lançamento é nesta sexta-feira (29), às 19h, nos perfis de Instagram @carlaakotirene e @oparasaberes.

Estarei no evento ao lado da atriz Taís Araújo e da jornalista Maria Júlia Coutinho, entre outras pessoas, para apoiar essa iniciativa tão importante e que merece o apoio daquelas e daquelas que acreditam na democratização do acesso e permanência de pessoas negras nas pós-graduações pelo país.

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