O COI (Comitê Olímpico Internacional) deixou entreabertas as portas para protestos durante os Jogos Olímpicos, quebrando a tradição de manter o evento estritamente focado nos esportes, na inclusão, no respeito e na solidariedade entre os povos.
Aparentemente, com coragem, arrumou sarna para se coçar, mas por um bom motivo, ou seja, insinuou uma interpretação mais ampla dos princípios da Carta Olímpica, o que deve incluir o combate ao racismo. Caso essa hipótese se confirme, o passo será grande.
A campanha pela igualdade de gênero, outra questão em pauta nas últimas décadas, também avança gradativamente ano a ano, sendo, com toda razão, tema relevante para o movimento olímpico internacional —antes tarde do que nunca.
Uma morte e um rendido que acabou baleado —homens negros, paisanos— em ações policiais nos Estados Unidos provocaram fortes manifestações de revolta naquele país, recentemente. Causaram indignação e deram ânimo para a luta internacional antirracista.
No território americano, pela visibilidade que desfruta na mídia, local e mundial, o esporte oferece um poderoso campo para protesto. Fica mais explosivo quando utilizado pelos próprios atletas, como aconteceu. O recurso vale principalmente para o basquete (NBA), o beisebol e o futebol americano.
Depois da eclosão dos protestos nos EUA, em solidariedade , surgiram manifestações contra o racismo em quase todo o mundo, tornando gigante a onda de indignação, que não para de crescer. Nem mesmo a pandemia do novo coronavírus inibiu os protestos, que avançaram até na elitista e milionária F-1, numa iniciativa do piloto inglês Lewis Hamilton, um supercampeão e ídolo da categoria.
Nas Olimpíadas, manifestações de atletas e demais participantes sempre foram contidas pelos regulamentos. Apesar disso, há registro de uma situação emblemática de grande repercussão. Deu-se na Cidade do México, em 1968, envolvendo os velocistas norte-americanos Tommie Smith e John Carlos, especialistas dos 200 m rasos do atletismo, ouro e bronze na prova, e o prata australiano Peter Norman, que foi receber sua medalha usando um broche do Projeto Olimpico para os Direitos Humanos.
Ao subirem no pódio, juntos, na cerimonia de premiacão, os norte-americanos fecharam o punho, vestindo luvas pretas e ergueram a mão repetindo a saudação do movimento 'Black Power' e do partido Panteras Negras, que reivindicavam mais direitos aos negros nos EUA.
O COI discordou do desafio e baniu os corredores das competicões (eles foram reabilitados poucos anos atrás), mas suas carreiras acabaram. A entidade considerou o gesto como uma atitude antidesportiva e inapropriada.
Levando em conta o ritmo do crescimento mundial dos protestos e reivindicações, os Jogos de Tóquio, em meados do ano que vem, poderão virar um provável palco a ser explorado por manifestantes dentro e fora das áreas de competição.
Mais do que causas justas, igualdade racial e de gênero são direitos humanos básicos.
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