Eduardo Sodré

Jornalista especializado no setor automotivo.

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Descrição de chapéu indústria

Audi vincula produção no país à quitação de dívida do governo, mas ainda é pouco

Dólar alto e volume de vendas baixo atrapalham produção de carro premium no Brasil

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A Audi vai interromper a produção de veículos no Brasil a partir de janeiro de 2021. A linha de montagem de onde sai o A3 Sedan deve ficar inoperante por um ano, mas a parada pode ser maior ou definitiva.

O retorno está vinculado ao recebimento de uma dívida gerada durante o programa Inovar-Auto, que vigorou de 2012 a 2017. O valor deveria ser pago pelo governo como estorno de tributos.

Johannes Roscheck, presidente da Audi no Brasil, afirmou nesta quinta (24) que está lutando pela continuidade da produção nacional, mas que não é fácil convencer a matriz a investir diante do não cumprimento de compromissos preestabelecidos.

A montadora não revela qual é o valor retido, mas não é a única na fila. BMW e Mercedes, que também investiram na produção local de seus carros de luxo, também aguardam que a promessa seja cumprida. Juntas, as três montadoras teriam aproximadamente R$ 290 milhões a receber.

Entretanto, é difícil acreditar que o simples pagamento dessa dívida seria suficiente para garantir a continuidade da produção nacional. Há outros complicadores.

O problema começou em 2011, quando surgiram as cotas de importação e a sobretaxa de 30% que incidia no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) dos veículos importados além do limite.

A manobra interrompeu a ascensão das montadoras chinesas e sul-coreanas –que, embora pagassem 35% de Imposto de Importação, já competiam em preço com as concorrentes instaladas no Brasil.

As marcas premium também foram afetadas pela medida, embora lidassem com volumes mais baixos de importação. Após meses de discussões, surgiu o programa criado no governo Dilma Rousseff (PT).

O Inovar-Auto tinha o objetivo de estimular a produção nacional e gerar empregos. Uma das promessas do plano era devolver às montadoras que investissem na produção nacional os trinta pontos percentuais pagos sobre o IPI na venda de modelos importados.

Atentas a um mercado que crescia a passos largos, as marcas premium viram a oportunidade de aumentar a rentabilidade por meio de fábricas nacionais.

A Audi tinha a Volkswagen como parceira e uma fábrica pronta em São José dos Pinhais (PR), o que era um diferencial importante. Em setembro de 2013, a montadora anunciou que retomaria a produção nacional. Foram investidos R$ 500 milhões nessa nova fase.

A estratégia foi semelhante à adotada no fim dos anos 1990, no primeiro ciclo de produção da marca no país: o modelo escolhido foi o sedã A3, que compartilhava plataforma com o Volkswagen Golf.

Mas o início já foi conturbado. Quando o primeiro Audi nacional chegou às lojas, no fim de 2015, o país estava mergulhado em uma crise que já havia reduzido pela metade o volume de carros vendidos.

As justificativas para a produção nacional se esvaíam enquanto as marcas premium faziam seguidas promoções para ganhar mercado.

A crise se agravou com a pandemia do novo coronavírus e o ministro da Economia, Paulo Guedes, não está disposto a pagar por promessas feitas em governos passados.

Roscheck diz que não se importaria em receber esse dinheiro parcelado ao longo de 10 anos. O que ele deseja é alguma garantia de que o reembolso será feito.

Mas o cenário está cada vez mais desfavorável à produção nacional. Os carros premium montados no Brasil têm alto volume de componentes importados, cotados em dólar.

Com a desvalorização do real diante da moeda americana e os custos operacionais de uma fábrica, seria necessário alcançar um alto volume de vendas para justificar a produção nacional.

De acordo com dados da Fenabrave (entidade que representa os distribuidores de veículos), a Audi vendeu 3.917 automóveis entre janeiro e agosto deste ano, e a maior parte foi importada. O nacional A3 Sedan respondeu por 1.053 emplacamentos.

Para manter a linha de montagem ativa, a empresa alemã teria de fazer mais um investimento com dinheiro vindo da matriz, pois será necessário adaptar a fábrica para receber a evolução dos modelos.

As novas gerações do A3 e do utilitário esportivo Q3 – que também foi produzido no Brasil – foram lançadas recentemente na Europa e passaram por extensas mudanças. No mercado de luxo, não renovar um automóvel significa decretar seu fim no mercado.

Há ainda mais um fator: carros híbridos e elétricos, que ganham espaço no portfólio das marcas premium, têm benefícios fiscais no Brasil. A depender do tipo de propulsão, podem obter isenção do Imposto de Importação e pagar menos IPI quando comparados a alguns veículos equipados somente com motores a combustão.

Portanto, é mais rentável apostar na importação de modelos menos poluentes e assim manter a competitividade –como faz a Volvo e a Lexus– do que investir na produção nacional de veículos de alto valor e baixo volume de vendas.

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