Elio Gaspari

Jornalista, autor de cinco volumes sobre a história do regime militar, entre eles "A Ditadura Encurralada".

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Última morada de JK pede socorro no entorno de Brasília

'Fazendinha' só está intacta graças ao altruísmo de uma família modesta

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Colhendo material para uma biografia de Juscelino Kubitschek, o repórter Lucas Figueiredo bateu em sua última morada, a “Fazendinha”, uma propriedade de 310 alqueires a 85 km de Brasília. Lá está a casa onde viveu o maior presidente da segunda metade do século. Intacta, graças ao altruísmo e sentido de história de uma família modesta, ela precisa que alguém ajude a preservar esse patrimônio.

É Lucas quem conta:

“No início da década de 1970, já de volta do exílio, JK comprou um pedaço de terra em Luziânia, interior de Goiás.

Começando do nada, construiu uma casa confortável (projeto de Oscar Niemeyer, com quatro suítes, pintada por fora de azul del rey para lembrar Diamantina), mas simples (o maior luxo era uma saleta que servia de sala de jogos e discoteca). Criou gado e produziu milho, trigo e café.

À noite, JK se punha na varanda a olhar as luzes de Brasília. Quando ele morreu, um admirador do ex-presidente, Lázaro Servo, comprou a fazenda, de porteira fechada.

Hoje, um dos filhos de Lázaro, Antônio Henrique Belizário Servo, mora na fazenda com a mulher, Rosana, e os filhos. Acordam cedo e trabalham muito para manter a fazenda produtiva.

A casa está hoje como se JK tivesse saído dela ontem. Os atuais moradores não usam a sala de estar, por exemplo. É proibido sentar nos sofás de vime e nas cadeiras estofadas de veludo alemão de cor laranja, todos originais. O carpete verde é original. A cozinha ainda guarda o fogão e as panelas da família. Nos armários, cristais, louças, prataria e roupa de cama dos Kubitschek.

Na garagem, está a Mercedes-Benz preta, ano 1963 (seis cilindros, banco em couro, volante em marfim), com a qual o ex-presidente um dia planejou fazer um leilão para angariar recursos para a campanha JK-65.

Em cima de um aparador, fica uma bela maleta que guarda fichas e baralhos, na qual, no dia 20 de novembro de 1971, JK anotou a caneta, no forro de feltro verde, ter feito um royal de copas.

A joia do conjunto é a biblioteca com cerca de 1.800 livros. Lá estão livros de medicina de JK da década de 1920 (ele era médico), o livro do bebê de sua filha Márcia no qual, em outubro de 1943, ele anotou que a menina dera o primeiro sorriso depois de mamar. Há volumes autografados por Pedro Nava, Oscar Niemeyer, José Sarney e pelo embaixador americano Lincoln Gordon.

Os visitantes não podem tocar nos livros. Os poucos pesquisadores que puderam fazê-lo tiveram de usar luvas de látex, por exigência de Rosana Servo.

Muito longe de serem ricos, os proprietários mantêm a fazenda-museu com grande dificuldade; o dinheiro só sai, não entra. Recentemente, tiveram de fechar os registros dos banheiros por semanas porque um vazamento ameaçava o carpete original. Há anos, eles reivindicam no Iphan o tombamento da fazenda, sem sucesso.

Acreditam que, com o tombamento, conseguirão ao menos garantir que a propriedade e seu acervo não irão se perder. Apesar de todas as dificuldades, estão dispostos a continuar botando dinheiro do próprio bolso para preservar um patrimônio nacional e a viver numa casa em que utilizam menos de metade do espaço”.

As casas do marechal Deodoro, de Prudente de Moraes e de Getúlio Vargas foram preservadas. A casa do sítio de João Goulart em Jacarepaguá foi demolida.

O que a família Servo faz pela memória de JK não tem precedente na história do Brasil.

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