Depois do barraco dos ministros-plantonistas Dias Toffoli e Luiz Fux em torno da criação do juiz das garantias, só um milagre de Santa Dulce dos Pobres devolverá ao Supremo Tribunal Federal o clima de cordialidade que convém a um plenário de 11 adultos.
Nem todo mundo está obrigado a sofrer com as batidas de cabeça das excelências. Há um refrigério nos Estados Unidos, na figura e na conduta de John Roberts, o presidente da Suprema Corte que preside o julgamento do impeachment de Donald Trump pelo Senado.
Seu cargo no tribunal é vitalício, sua função no julgamento é secundária e ele já disse que os juízes são como os árbitros de competições esportivas, pois ninguém vai aos estádios para vê-los. Mesmo assim, repreendeu senadores dos dois partidos pela má qualidade de suas retóricas. Esta é a segunda vez em que ele cruza com o destino de um presidente americano. Em 2000, foi um dos conselheiros da equipe de Bush, o jovem, na disputa judicial que derrubou Al Gore.
Não se sabe se Roberts interferirá na blindagem com que os republicanos querem proteger Trump, desprezando novos documentos ou novas testemunhas.
O juiz completará 65 anos nesta segunda (27) e está na cadeira desde 2005. É um tremendo sujeito, conservador de vitrine. Ri de boca fechada, não fala abobrinhas e parece ter decidido ir para a Suprema Corte quando ainda era um estudante em Harvard. Bom aluno, bom atleta (luta livre), ia à missa aos domingos, foi assessor de grandes juízes, trabalhou na Casa Branca e ganhou algum dinheiro na banca privada (litigou 39 casos na Suprema Corte e prevaleceu em 25).
Visto pela biografia, seria um juiz carimbado. Nasceu numa das localidades mais segregadas dos Estados Unidos e não gosta de políticas afirmativas, mas surpreendeu o país ao dar o voto decisivo para a sobrevivência do Obamacare, que redefiniu a estrutura da saúde pública americana.
Como Roberts não gosta de holofotes, uma vinheta de sua vida mostra quem é esse católico, casado com uma bem-sucedida advogada, também católica e militante contra o aborto. Eles se casaram quando tinham mais de 40 anos, não conseguiam ter filhos e decidiram adotar uma criança. Um dia, quando já tinham combinado a adoção de um bebê que nasceria em poucos meses, receberam um telefonema de outra agência, informando que um menino nasceria no dia seguinte e a mãe escolhera o casal Roberts para adotá-lo. Adotaram os dois. Joe e Josephine estão com 16 anos.
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