Elio Gaspari

Jornalista, autor de cinco volumes sobre a história do regime militar, entre eles "A Ditadura Encurralada".

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Bolsonaro aguou o Bicentenário

Há 200 anos, o Sete de Setembro é uma festa de todos

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O repórter Lauro Jardim deu uma pequena notícia ruim que reflete o tamanho do atraso em que o Brasil está metido. Os presidentes do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral estão tomando providências para proteger os dois prédios no dia Sete de Setembro.

Fux coordenou a formação de três anéis de proteção e no dia do bicentenário da Independência isolará uma área de 1,5 quilômetro de raio. O ministro teme a repetição das provocações do ano passado, quando caminhoneiros furaram o bloqueio da Esplanada dos Ministérios. Caravanas de ônibus levaram manifestantes que criticavam o tribunal e defendiam a cloroquina.

Fachada do STF - Gabriela Biló-3.mai.22/Folhapress

Na manhã do dia Sete, Bolsonaro discursou na Esplanada e ameaçou: "Ou o chefe desse Poder (Luiz Fux) enquadra o seu ministro (Alexandre de Moraes), ou esse Poder pode sofrer aquilo que não queremos." À tarde, na avenida Paulista, foi adiante: "Tem tempo ainda de arquivar seus inquéritos. Sai Alexandre de Moraes, deixa de ser canalha, deixa de oprimir o povo brasileiro."

200 anos o Sete de Setembro é uma festa de todos. Não tem o clima festivo de 14 de julho francês nem do 4 de julho americano, mas nenhum governo fez do Sete de Setembro um dia de vulgar mobilização partidária e divisiva.

As ditaduras promoviam patriotadas, sempre com algum conteúdo cívico. Há um século, o presidente Epitácio Pessoa trabalhou e comemorou o centenário com uma grande exposição internacional, congressos e visitas ilustres. Em São Paulo, inaugurou-se o monumental Museu do Ipiranga, com seus jardins. Cinquenta anos depois, o presidente Emílio Médici passeou pelo país os restos mortais de d. Pedro 1º e promoveu uma dezena de louváveis iniciativas culturais.

Em plena ditadura, Médici fez do Sete de Setembro um dia de congraçamento. Segundo o Ibope, 84% dos brasileiros diziam-se satisfeitos com a situação do país. O presidente cavalgava a própria popularidade, mas cortou as manobras que lhe permitiriam uma reeleição. No dia 6 proibiu-se a transcrição do decreto de d. Pedro abolindo a censura.

(Durante o mês de setembro de 1972, no Araguaia, a ditadura matou pelo menos nove militantes do PC do B e os guerrilheiros mataram um sargento e um camponês. No Rio foi morto um bancário durante um assalto a banco na Penha)

A essência do Sete de Setembro divisivo de 2022 partiu do Planalto. Pena que esse mesmo governo não tenha feito da data um momento de reflexão histórica. Salvo uns poucos eventos de abnegados, o bicentenário da Independência será lembrado pela reinauguração do Museu do Ipiranga, obra de governos paulistas, com a ajuda de empresários, valorizada por João Doria.

Pelo menos nesse evento, os brasileiros estarão juntos, tendo o que festejar, pois o museu foi reerguido depois de décadas de decadência. Bolsonaro, seus ministros da Educação e secretários de Cultura reclamam da influência esquerdista nos currículos. A celebração de personagens e de datas é uma das joias do pensamento conservador e no centenário a República Velha deu ao país o Museu do Ipiranga. Felizmente, o museu será devolvido ao público.

Como ensinava Sérgio Buarque de Holanda, conservador é uma coisa, atrasado é outra.

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