Esper Kallás

Médico infectologista, é professor titular do departamento de moléstias infecciosas e parasitárias da Faculdade de Medicina da USP e pesquisador na mesma universidade.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Esper Kallás
Descrição de chapéu Coronavírus

Mucosas e o novo coronavírus

Conhecer como nos defendemos é a chave para entender o efeito das vacinas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

A discussão central sobre a pandemia de Covid-19 mudou de foco. Tudo provocado por uma observação que a variante delta tornou mais evidente: embora seja incomum, por que pessoas vacinadas ainda podem transmitir o vírus?

Esta coluna já abordou o tema quando trouxe à tona o aumento de casos que estava sendo observado nos Estados Unidos, em Israel e em vários países da Europa. Muitos associados à variante delta do novo coronavírus, a despeito de maior cobertura vacinal, ou seja, acontecendo onde a grande maioria dos adultos já recebeu o esquema completo de vacinação. Algo semelhante está agora sendo visto na Ásia, incluindo a China, onde a vacinação também já chegou para boa parte da população.

O curioso é observar que nesses países, embora haja aumento no número de casos, não está havendo aumento no número de internações e mortes pela Covid-19 em ritmo correspondente.

Homem recebe dose de vacina contra a Covid-19 em São Paulo - Rahel Patrasso - 25.jul.2021/Xinhua

Traduzindo, podemos definir como uma proteção parcial contra a variante delta induzida pelas vacinas: o vírus entra no organismo, se multiplica, causa sintomas leves, mas não é capaz de desencadear a intensa inflamação que acomete principalmente os pulmões e pode levar à morte.

Onde está a chave? Muito provavelmente, na defesa da mucosa contra o novo coronavírus.

Mucosa é o tecido que reveste as cavidades internas do corpo, incluindo, por exemplo, o tubo intestinal, a parte interna dos genitais e, importante para a Covid-19, o revestimento interno do sistema respiratório, que vai desde a cavidade nasal até as ramificações mais profundas dos pulmões. Ganha esse nome porque produz muco, substância que mantém a umidade superficial.

É nas superfícies da mucosa do sistema respiratório que ocorre o confronto inicial entre o novo coronavírus e o corpo. Nesse território o vírus se multiplica e dá o gatilho para uma série de eventos que desencadeiam a doença.

O que as vacinas fazem? Simulam o contato entre o vírus e o sistema de defesa, levando à formação de mecanismos protetores, especialmente educando células do sistema imune e provocando a formação de anticorpos que atuam contra os germes.

Aí as coisas ficam um pouco mais complexas. Como as vacinas são aplicadas com agulhas, no músculo, parecem não ser suficientes para provocar defesa na mucosa do sistema respiratório e, portanto, não são capazes de impedir a multiplicação inicial do novo coronavírus em alguns vacinados. Este fato ficou mais evidente após a chegada da variante delta, que exige um pouco mais do sistema imune, quando comparada às outras variantes.

Daí vem a razão para a rediscussão sobre o papel das vacinas em provocar uma resposta imune mais forte na mucosa, notadamente do sistema respiratório.

Há clamor crescente para que sejam realizadas pesquisas que aprofundem sua atuação na defesa desses tecidos, também em como os anticorpos chegam e se estabelecem na mucosa, além de quais células temos que melhor “ensinar” para cumprirem o papel protetor nesses locais.

Talvez seja preciso desenvolver uma nova geração de vacinas. Produtos que levem à proteção contra o novo coronavírus nos passos iniciais da infecção, ao entrar no sistema respiratório. Formulações diferentes? Vacinas dadas direto no nariz ou suspensas em vapores que podem ser inalados?

É o caminho para que, quem sabe, tenhamos uma vacina que seja totalmente protetora. Possivelmente, o único caminho para ficarmos livres da circulação do novo coronavírus.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.