Convivemos com uma série de germes transmitidos pela tosse, pelo espirro ou pelo contato direto —como, por exemplo, quando se cumprimenta alguém que não lavou as mãos após ter coçado o nariz.
Considerando apenas os vírus, há um grande número de germes. Embora a maioria não provoque nada além de um simples resfriado, alguns podem gerar doenças graves. A infecção pelo vírus influenza (causador da gripe) ou pelo vírus sincicial respiratório pode ser fatal em uma minoria das pessoas.
Desde a identificação da doença causada pelo novo coronavírus, intervenções não farmacológicas impostas pela pandemia de Covid-19 foram amplamente adotadas. Várias estratégias, muitas bastante polêmicas, como redução da mobilidade, fechamento de escolas, restrição de viagens e uso de máscaras em ambientes públicos, foram absorvidas por grande parte da população mundial.
Mas qual foi o real impacto destas medidas na transmissão de outros germes? Muito significativo, segundo dados gerados nos EUA. Estudos de acompanhamento de casos de doença por influenza e vírus sincicial respiratório mostraram melhora significativa das taxas de infecção a partir de março de 2020. Além disso, o número de casos acumulados em 2021 é baixíssimo, justamente nas estações em que costumam aumentar. Achados semelhantes já estão disponíveis em outros países.
Não há surpresa aqui, afinal o caminho que o novo coronavírus usa para ser transmitido é semelhante ao de outras doenças de transmissão respiratória. E qual o resultado desta “calmaria” sobre elas?
Levando em conta que não temos vacinas para o vírus sincicial respiratório e a vacina para influenza tem eficiência e durabilidade limitadas —razão pela qual é indicada somente para grupos específicos— esse período, onde a maioria não teve contato com ambas as viroses, poderá acarretar, consequentemente, um acúmulo de pessoas suscetíveis.
O uso de testes para outras viroses, especialmente influenza, também foi relaxado pela avalanche de casos de Covid-19. Uma postura comum do tipo “se não é Covid-19, tá bom”, tomou o senso comum.
Com a liberação da imposição e o cansaço de todos com essas medidas não farmacológicas, podemos estar montando o mise en place perfeito para o aumento de casos destas outras doenças, que pode ser explosivo. São gigantes adormecidos.
A pandemia de Covid-19 acendeu vários alertas sobre nossa postura em relação à saúde. Não basta que a pandemia seja controlada para “voltarmos ao que era o mundo até o fim de 2019”. É preciso que esta crise sirva para desencadear uma profunda mudança na abordagem da saúde coletiva.
O Brasil peca por não ter sistemas de vigilância epidemiológica mais eficientes. Precisamos aprimorá-los para as doenças que conhecemos, em especial aquelas transmitidas pela respiração.
Postos de saúde, prontos-socorros, de adultos e crianças e até mesmo farmácias, precisam contar com testes rápidos e eficazes para o diagnóstico de doenças e a informação de sua ocorrência deve ser rapidamente processada. É a melhoria dessas ferramentas que permitirá a identificação dos problemas e a geração de respostas rápidas pelos gestores, possibilitando a preparação de estoques estratégicos de suprimentos e medicamentos para os cuidados com os enfermos e seus contatos.
Esse é um preço baixo a pagar para que se esteja preparado para doenças que são conhecidas. E também para doenças ainda não conhecidas, que virão. Cortar investimentos na área da saúde e não otimizar o uso de recursos, especialmente em inteligência, é a fórmula certa para dar tudo errado.
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