Esper Kallás

Médico infectologista, é professor titular do departamento de moléstias infecciosas e parasitárias da Faculdade de Medicina da USP e pesquisador na mesma universidade.

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O experimento ômicron

A pandemia da nova variante é demonstração da força da seleção Darwiniana

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Sem deixar de lamentar o enorme sofrimento causado pela pandemia de Covid-19, e por nosso despreparo diante dela, nos deparamos com a extraordinária trajetória do vírus Sars-CoV-2.

Ao tentar se estabelecer como um vírus perene nos humanos, seu novo hospedeiro desde o fim de 2019, vem se adaptando para cada vez cumprir melhor este papel. No início, transitou livremente, em
solo virgem, pela ausência de defesa natural preexistente nas pessoas.

Com o tempo, desenvolveu e fixou pequenas alterações em sua sequência genética: as mutações. A grande maioria destas não resulta em vantagens para o vírus, mas algumas ajudam em sua disseminação. Quando isso acontece, a nova variante consegue se espalhar.

O ano de 2022 chegou com a dúvida de como a variante ômicron atingirá o planeta
O ano de 2022 chegou com a dúvida de como a variante ômicron atingirá o planeta - Roberto Schmidt - 31.dez.21/AFP

Qual característica favorece uma variante? Sua maior capacidade de se multiplicar e, consequentemente, ser transmitida, a coloca em vantagem na "corrida", fazendo que prevaleça sobre as demais.

Tem sido assim até agora. O vírus vem sofrendo adaptações desde o início da pandemia, permitindo o surgimento de variantes com capacidade crescente de transmissão. Depois do vírus original, que causou a primeira onda, apareceu a variante alfa, que se alastrou rapidamente.

No Brasil, provavelmente a partir da região Norte, a gama se estendeu para o restante do país, deslocando as variantes anteriores. Mas foi a variante delta que demonstrou ser capaz de substituir todas as anteriores, tornando-se responsável por mais de 95% dos casos de Covid-19 no mundo todo.

Enquanto ainda nos assombra a potência de disseminação da variante delta, a ômicron, com número inédito de mutações, vem demonstrar que a adaptação do vírus pode ir além, adicionando capacidade de transmissão sem precedentes.

A nova variante está substituindo a delta a passos ligeiros. Além disso, acumulam-se evidências de que se trata de uma variante menos agressiva, especialmente em vacinados.

Poderia, a rápida disseminação da ômicron, substituir as variantes mais agressivas e letais ou somente acobertará por um tempo a disseminação da delta? Poderia servir de um estímulo à defesa, como uma vacina de vírus "enfraquecido", ajudando a controlar a pandemia?

As avaliações cuidadosas, principalmente sobre casos de internações e mortes relacionadas à Covid-19, trarão respostas. E aqui cabe lamentar a incapacidade atual do Ministério da Saúde em compilar e disponibilizar dados, fazendo o país navegar no escuro.

Em outros países, a ômicron causa ciclo explosivo de transmissão, de aproximadamente dois meses. Entretanto, a velocidade e o preço que cobrará em internações e mortes pode variar, especialmente pela percentagem de vacinados na população.

É fundamental que todos encarem a ômicron com o máximo de cautela. A história ensina a não subestimar a natureza que, frequentemente, reserva surpresas. Basta lembrar da epidemia de Zika em 2015. O que parecia ser uma doença febril banal, revelou-se devastadora para muitos bebês nascidos de gestantes infectadas.

Estudar com profundidade o que está se passando é a única alternativa aceitável.

Verificar o comportamento da nova variante, buscando soluções mesmo que possam parecer desnecessárias.

Afinal, é para aliviar o sofrimento humano, salvar vidas e prolongá-las com qualidade que as ciências biomédicas têm buscado contrapor a seleção natural Darwiniana.

Tomara que em 2022 os brasileiros reconheçam os investimentos em educação, ciência e saúde como prioritários. Assim, em importante ano eleitoral, todos podem cobrá-los de candidatos a gestores.

Só assim o Brasil terá um presente e um futuro melhores.

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