Fabrício Corsaletti

Poeta e cronista, autor de "Esquimó" e "Perambule".

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Fabrício Corsaletti

O Tigre Roxo

O que foi visto durante uma viagem de Réveillon de 2000 ou 2001

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Romolo

No Réveillon de 2000 ou 2001, alugamos duas casas numa vila da serra da Canastra. Confiro no Google: Arraial de São João Batista da Canastra. Ou era São Roque de Minas? Não lembro. Mas não importa.

O núcleo duro era formado pelo pessoal da faculdade de letras, mas tinha também uns dois ou três casais mais velhos, com filhos, amigos de amigos, e minha irmã, que tinha vindo do interior de São Paulo pra viajar com a gente pelo interior de Minas.

Cachoeiras, bebedeiras, maconheiras, música brasileira. E no meu caso muitas brigas com a minha namorada da época. 

Foi uma viagem tensa. Mas aos 20 anos você não deixa de se divertir porque está com raiva ou deprimido. Acha que faz parte. Hoje eu teria ido embora antes. Ficamos dias demais por lá. Uns 15 ou 20. Mando um WhatsApp pra minha irmã, e ela garante: uma semana, goiaba.

Minha melhor lembrança dessa temporada confusa e cheia de chuva é a do porco na lata com tutu de feijão que comi num restaurante caseiro cujo fogão à lenha era pilotado por uma senhora gorda e sólida como uma avó do século 20. Depois de dias de delírio, nada melhor que o bom e velho mundo real.

Minha irmã me dava uns conselhos que funcionavam por meia hora ou menos. Um amigo nosso ficou super doente, ninguém sabia o que era —houve um certo pânico. E então, numa noite em que metade da turma tomou ácido, Lábios (hoje ele é um crítico literário marxista importante, melhor não revelar sua identidade diante de um governo careta e autoritário), que fazia parte da metade alucinada, entrou na sala aos berros:

— Eu vi um tigre roxo! Eu vi um tigre roxo!

Gargalhadas dos sóbrios —ou bêbados, mas àquela altura do campeonato os únicos sóbrios eram os bêbados. Euforia dos loucos, que imploravam por detalhes. Choro desesperado das crianças: primeiro porque ficaram com medo, segundo porque os pais não queriam deixá-las seguir o tiozão doidão até o Vale da Morte Horrível, como ele apelidou o brejo de violetas do quintal do vizinho (que nos odiava) onde vivia o Tigre Roxo.

O Tigre Roxo que anda solto nas estradas.

O Tigre Roxo que passeia nas ruas.

O Tigre Roxo que invadiu o palácio.

O Tigre Roxo que, num golpe, pode nos estraçalhar.

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