Fernanda Mena

Jornalista, foi editora da Ilustrada. É mestre em sociologia e direitos humanos pela London School of Economics e doutora em Relações Internacionais.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Fernanda Mena

Ela não pede favores para o seu sexo

Documentário remonta vida de Ruth Bader Ginsburg, juíza da Suprema Corte dos EUA que virou ícone pop feminista

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Quando o movimento feminista tomou as ruas dos Estados Unidos, nos anos 1960, a discreta a advogada Ruth Bader Ginsburg sabia que o calor das manifestações não era o seu lugar, por mais que compartilhasse das mesmas ideias das ativistas.

Ela, que havia iniciado os estudos de Direito em Harvard —onde se contavam nos dedos das mãos as estudantes mulheres em meio a mais de 500 homens—, decidiu que sua luta pela igualdade entre os gêneros se daria nos ambientes mais sisudos e dominados por homens brancos da elite norte-americana: os tribunais.

Naquela época, havia leis nos EUA que amparavam a demissão de mulheres por gravidez e eximiam de persecução penal o chamado estupro marital, quando a violência sexual é cometida pelo próprio marido da vítima.

Sinal dos tempos, esse tipo de legislação não era visto como discriminatório ou prejudicial às mulheres. Isso até Ruth Bader Ginsburg entrar em cena."Eu me via como uma professora de jardim da infância porque os juízes não acreditavam que existia discriminação contra mulheres", conta ela em uma cena de "A Juíza".

O documentário de Betsy West e Julie Cohen indicado ao Oscar 2019, estreia agora no Brasil e revela a personagem fascinante por trás da prestigiosa e determinada jurista.

Ruth pautou suas batalhas judiciais contra a discriminação de gênero na mesma estratégia usada pelo movimento pelos direitos civis dos negros nos EUA. O argumento apresentado perante a corte constitucional norte-americana era baseado na 14ª emenda, que garante proteção igual a todos perante a lei.

Ao escolher casos que tinham chances de chegar à Suprema Corte, onde era possível promover mudanças concretas nas leis, Ruth se transformou em um pesadelo contra a retaguarda machista. Passou a ser conhecida por suas iniciais acompanhadas do título de notória: Notorious RBG.

Ela foi nomeada juíza em 1980 e, em 1993, se tornou a segunda mulher a ocupar uma cadeira na Suprema Corte dos Estados Unidos, onde hoje, aos 86 anos, é decana e ícone pop feminista a um só tempo. Seu rosto estampa camisetas, canecas, tatuagens e capas de revistas.

Ainda que sua ação tenha colocado a igualdade de gênero no espírito das leis, é curioso notar como esta premissa permanece distante do meio jurídico.

Hoje, nos EUA, as mulheres são apenas 33% dos juízes federais e 33% dos magistrados estaduais, ainda que o sexo feminino represente 50,8% da população do país.

No Brasil, em 2018 mulheres eram 38,8% dos magistrados, de acordo com levantamento do Conselho Nacional de Justiça, e 51,6% da população. Esta proporção já foi maior: entre 1991 e 2010, ao menos 40% dos juízes brasileiros eram mulheres.

Sem uma explicação óbvia para essa queda na participação feminina entre magistrados no Brasil, especula-se o quanto ela pode ser atribuída ao fato de mulheres dedicarem ao trabalho doméstico quase o dobro de horas que os homens, acumulando funções que prejudicam seu desempenho profissional.

Quando observado que, entre desembargadores, mulheres são apenas 23% e, nos tribunais superiores, 16%, é de se pensar que talvez pese neste quadro a questão das indicações (ou da falta delas, no caso), muitas vezes em poder de homens.

RBG gosta de citar a célebre frase da sufragista e abolicionista americana Sarah Grimké, que em 1837 já apontava para a necessidade de igualdade entre os gêneros: "Eu não peço favores para o meu sexo. Tudo o que peço a nossos irmãos é que tirem os pés de nossos pescoços".

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.