Em linhas gerais, o governo Jair Bolsonaro foi apresentado. Mas falta o principal: que profundidade, prazo e intenção terá sua reforma da Previdência?
Bolsonaro sugere agora fatiá-la, começando por elevar a idade mínima para a aposentadoria. Diz que vai discutir antes com os partidos, minimizando o risco de tentar votá-la e acabar derrotado, o que seria assustador.
Prudência é sinal de bom senso, mas traz riscos.
Maurício Macri tentou o gradualismo na Argentina e se deu mal. Aguou a intensidade das reformas e, quando a maré do mercado virou, acabou de pires na mão, pedindo US$ 57 bilhões ao FMI para segurar a brutal desvalorização do peso.
No Brasil, três grandes despesas equivalem a toda a arrecadação anual do governo, de R$ 1,3 trilhão: Previdência (R$ 590 bilhões e a maior delas), juros da dívida pública (R$ 400 bilhões) e folha de pagamentos da União (R$ 300 bilhões).
Como há também gastos com educação e saúde, entre outros, o governo tem de se endividar para obter dinheiro e continuar funcionando. Na prática, portanto, está quebrado.
Os juros da dívida pública, por exemplo, são rolados; e toma-se dinheiro no mercado (também a juros) para cobrir o rombo que resulta entre o que a Previdência arrecada e o que paga aos beneficiários –um buraco de R$ 300 bilhões ao ano.
A proposta inicial do governo Temer para a Previdência previa uma economia de R$ 850 bilhões em dez anos. Modificada na Câmara, sua última versão reduziu o valor para R$ 550 bilhões (R$ 470 bilhões de economia no regime privado e R$ 80 bilhões no público).
Note-se que o rombo da Previdência é de R$ 300 bilhões ao ano e que a economia proposta seria de R$ 550 bilhões, só que em dez anos. Ou seja, a reforma não resolve o rombo, apenas alivia.
Mas ela pode gerar mais confiança entre empresas, investidores e consumidores de que o Brasil não terá de continuar se endividando tanto e indefinidamente.
Se a confiança volta, a atividade econômica tende a aumentar. A arrecadação de impostos cresce e sobra mais dinheiro entre o que se gasta com despesas fixas e o que entra no caixa do Tesouro.
Há, assim, queda tanto na necessidade de endividamento quanto, no longo prazo, da dívida.
Uma reforma da Previdência menos ambiciosa do que a dos R$ 550 bilhões em dez anos significa, portanto, que nosso endividamento cairá bem mais lentamente.
O risco é o mercado não confiar que o governo continuará honrando a dívida e passar a exigir juros cada vez maiores, agravando o endividamento. Se houver uma crise externa ou de confiança no caminho, pior ainda.
Paradoxalmente aqui, quanto mais “light” e fácil de aprovar a reforma da Previdência, maior o risco de fracasso de Bolsonaro.
O quadro abaixo mostra a dimensão e os prazos de vencimento da dívida pública. A linha branca que o atravessa em direção ao topo à direita explicita seu crescimento em relação ao PIB. Quanto mais alta essa relação, piores as condições de o país se financiar e maior o risco de uma crise.
É alarmante como a trajetória se acentuou nos últimos anos. A maior causa disso, hoje, é o deficit na Previdência.
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