Pandemia, mortes, crise econômica, pobreza e guerra. Vivemos um dos momentos mais trágicos da humanidade, que ficará marcado nos livros de história para gerações futuras.
Os desastres são tantos que nos levam a pensar que a Revolução Francesa, cuja guilhotina arrancou umas 40 mil cabeças, não foi tão ruim assim.
Para muitos jornais, no entanto, o leitor não está pronto para a realidade e precisa ver as tragédias do mundo com mais leveza. É preciso tirar uma lição positiva de tudo isso, por mais que estejamos à beira de um apocalipse. É tanto aprendizado, que os noticiários estão cada vez mais longe do jornalismo e mais próximos do site Razões para Acreditar. É sensacionalismo positivo.
O preço da carne subiu 35%? O que importa é manter a leveza. "Criatividade na cozinha: veja cinco formas de substituir a carne pelo ovo sem cair na mesmice", no jornal O Globo. Porque passar fome é só para quem não é criativo.
O número de pessoas abaixo da linha da pobreza disparou, mas sempre há um jeito.
"Brasileiro ‘se vira’ para driblar a fome; confira como substituir alimentos", no jornal Extra. Afinal, dá para se virar com feijão em pedaço e farelo de pão. Só passa fome quem quer.
Muitas vezes o positivismo tóxico pode intoxicar o leitor. "Quando é seguro comer pão, queijo e outros alimentos mofados?", nesta Folha. O preço alto dos alimentos não é problema quando podemos comer mofo.
O governo está ruim? Será, mesmo? "A gasolina está mais cara agora do que no governo Dilma?", diz o UOL. Mesmo que, matematicamente, R$ 3 sejam menos que R$ 8, mesmo que a inflação e o dólar tenham
subido proporcionalmente, pode ser, quem sabe, que a gasolina não esteja tão cara. Só quem ler a matéria vai descobrir que sim, está.
A guerra deixa nossos leitores tristes. Vamos mostrar o lado bom? "Menina ucraniana viraliza ao cantar ‘Let It Go’ em bunker", no Estadão. As crianças ucranianas estão sendo bombardeadas, mas o importante é que elas ainda viralizam no subsolo.
"A esperança que se renova ao som das bombas. Mães dão à luz em porão de Mikolaiv, na Ucrânia", n’O Globo. É preciso comemorar que a vida brota de qualquer lugar, mesmo que seu bebê possa morrer a qualquer hora.
O importante é levar com leveza, mesmo com tudo para desabar. Assim, o mundo entra em colapso e não sentimos o impacto.
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