Flavia Lima

Repórter especializada em economia, é formada em ciências sociais pela USP e em direito pelo Mackenzie. Foi ombudsman da Folha de maio de 2019 a maio de 2021.

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Flavia Lima

Com a palavra, o leitor

Em épocas turbulentas, é sempre bom ponderar antes de se expressar

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Poucas ocorrências deixam o leitor tão frustrado quanto não poder dizer o que pensa de reportagens no site da Folha.

Já foi o tempo em que o leitor aceitava o que lia sem poder se expressar. Só em julho, foram 47 mil comentários espalhados pelo site —uma média de 1.500 intervenções por dia.

Ilustração Ombudsman
Carvall

Nesse universo particular, excessos acontecem, o jornal tem ferramentas para tentar contê-los, mas o leitor nem sempre entende os mecanismos  ou os aceita muito bem. 

“Infelizmente a Folha, por política da casa ou completo desleixo, está assinando embaixo essa injustiça de calar quem pensa diferente. Com certeza vou procurar assinar outro jornal, mais justo e democrático”, desabafou um leitor que teve alguns de seus comentários suspensos em junho.

Em outro contato, um leitor disse que só assinava a Folha para fazer comentários e que, se o jornal continuasse impedindo-o de se manifestar, pediria a exclusão de sua conta. Um terceiro questionou: “Existem critérios objetivos que  justifiquem o bloqueio ou não de determinadas expressões?”.

Sim, esses critérios existem. Desde 2005 é possível comentar o conteúdo do site da Folha. À época, nem tudo aceitava comentários, mas qualquer pessoa podia se expressar.

Em 2012, o sistema atual de gestão de mensagens foi criado e o ato de criticar o jornal pelo site se disseminou.

Mais à frente, em 2016, outra mudança importante ocorreu: os comentários passaram a ser restritos aos assinantes da Folha e o anonimato acabou.

De repente, posts antigos passaram a aparecer no site sob o nome verdadeiro do assinante, o que, em alguns casos, causou constrangimento. 

Hoje, sem nome e sobrenome, além de CPF e de um endereço de email, não é possível fazer comentários. Ao fazê-lo, porém, o leitor aceita que não pode usar linguagem ofensiva, veicular material racista ou se afastar do tema da reportagem. Nem postar links de outros sites ou a mesma frase várias vezes.

Um comentário que se enquadre em um desses casos é barrado de modo automático pelo sistema e vai direto para a moderação, feita pela editoria de mídias sociais da Folha.

Quem estabelece o que é linguagem ofensiva é o jornal. Para isso, há uma lista de xingamentos e outros termos que não são ofensa, mas podem ser usados para ofender.

São milhares de palavras consideradas problemáticas e suas variações. Se livro fosse uma delas, seria possível encontrar na lista livro, li-vro, l.i.v.r.o e assim por diante. 

O editor de home page e mídias sociais da Folha, Ygor Salles, diz que a lista passa pelo crivo da Secretaria de Redação, sofre constantes atualizações e não é pública para evitar que as pessoas burlem o sistema.

Em caso de infração, o leitor recebe um aviso por email. Se repete o feito, perde o direito de fazer comentários automáticos, e tudo o que postar  passará por avaliação.

Se, mesmo assim, continuar postando coisas fora do padrão, pode ser bloqueado. Os assuntos mais polêmicos variam com o tempo. Até o governo Bolsonaro, a Lava Jato e o conflito entre Israel e Palestina rendiam os maiores embates—e mais trabalho ao  repórter que se dedica a isso.

Nas questões que envolvem o Oriente Médio, há até um assinante conhecido por driblar os bloqueios aplicados  criando perfis diferentes.

Como estratégia para assinar o jornal e comentar sob disfarce, esse assinante chegou a usar nomes e CPFs  encontrados na internet (dispostos em listas de concursos ou de vestibulares, por exemplo).

Como ele é denunciado por comentaristas rivais, não leva muito tempo até que seja descoberto e proibido. Às vezes, como forma de se gabar da estratégia, ele mesmo acaba dizendo que atua sob 
o nome de fulano de tal.

Atualmente, do universo de mais de 300 mil assinantes, de 100 a 200 pessoas têm seus comentários sob moderação.

O jornal conta ainda com um botão de denúncia—uma forma de o próprio assinante dizer quando um comentário descumpriu a regra. E, em assuntos mais sensíveis, como a morte de um parente de um político, o jornal tem a prerrogativa de bloquear comentários.

Com razão, o leitor encara como um direito básico dialogar com o material produzido pelo jornal. O espaço dado a ele é crucial para uma imprensa que se pretende democrática—e não quer perder os seus leitores para as redes sociais.

Outro ponto é que os comentários podem servir como fonte de reflexão para o repórter.

Mas nesse jogo não vale tudo. Impedir que o debate descambe para a defesa do indefensável (sobretudo do racismo e de preconceitos) é, mais do que saudável, necessário.

Em épocas turbulentas, em que os nervos estão à flor da pele, é bom fazer algumas ponderações antes de se expressar.

A Folha entende que os comentários são parte da matéria e não retira artigos nem 
comentários do ar.

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