Gabriel Kanner

Presidente do Instituto Brasil 200, é formado em relações internacionais na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).

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Descrição de chapéu Caixa Econômica Federal

Devemos privatizar todas as estatais, mas e a Caixa?

Banco estatal teve papel imprescindível durante a pandemia

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É inegável que o Brasil tem um número assombroso de empresas estatais. São quase 700 empresas com alguma participação do governo, número absolutamente desproporcional se comparado com qualquer outro país do mundo. O enxugamento da máquina pública é fundamental para conseguirmos modernizar o Estado brasileiro e torná-lo mais eficiente, e esse processo naturalmente passa pela venda de ativos estatais.

Sempre defendi que esse era o caminho correto para o Brasil e sempre fui favorável à privatização de qualquer estatal. Porém, durante a pandemia, confesso que fiquei dividido em relação à venda da Caixa Econômica Federal.

A história da Caixa começou poucas décadas depois da Independência do Brasil. Em 1861, um decreto assinado por dom Pedro 2º, filho do nosso primeiro imperador, dom Pedro 1º, deu origem à Caixa Econômica da Corte. Mais de cem anos depois, em 1969, foi decidido por meio de um decreto presidencial que a Caixa seria constituída como uma empresa pública, e passaria a ter como deveres os serviços de natureza social e o desenvolvimento do país. Desde então, a instituição passou a assumir cada vez mais o papel de banco social do Brasil.

Esse papel social se provou imprescindível durante o período atípico e desafiador da pandemia da Covid-19. Em um país que ainda convive com a extrema pobreza em praticamente todos os estados, principalmente no Norte e no Nordeste, o pagamento do auxílio emergencial era crucial para garantir a “travessia” da população mais carente durante o período de paralisação econômica.

Para conseguir atender a essa necessidade urgente, a Caixa, com seus 160 anos de idade, passou por um processo de digitalização impressionante. Em duas semanas, o banco saiu de 30 mil clientes digitais para 50 milhões. Ao todo, 68 milhões de brasileiros receberam o pagamento do auxílio emergencial. Desses, 38 milhões eram os chamados ‘invisíveis’ —pessoas fora do sistema financeiro que, até então, não conseguiam ser localizadas pelo governo.

Tendo em vista que o auxílio emergencial foi proposto pelo governo, aprovado pela Congresso e rapidamente distribuído por um banco estatal, fica a pergunta: como teríamos feito isso sem a capilaridade e a natureza social da Caixa?

Temos que levar em consideração que a atual gestão da Caixa também facilita o argumento contrário à privatização. Diversas transformações têm sido promovidas desde 2019 para mudar a imagem e os resultados do banco. Ao longo dos últimos anos, a Caixa esteve envolvida em diversos escândalos de corrupção. Porém a gestão de Pedro Guimarães tem mudado esse cenário. Em suas duas primeiras semanas, Pedro trocou 105 dos 120 principais executivos do banco, incluindo vice-presidentes, diretores e superintendentes regionais. Praticamente todos eram indicações políticas. Os patrocínios para clubes de futebol também foram suspensos, além de diversas outras ações para tornar o banco mais eficiente. E o resultado apareceu: o lucro registrado no primeiro semestre de 2021 foi de R$ 10,8 bilhões, o melhor resultado da história.

Ao mesmo tempo em que o atual momento da Caixa é fantástico e deve ser comemorado, ele também acende um sinal de alerta. Ficou claro para todos que a Caixa é uma ferramenta poderosíssima. Ela tem uma enorme capilaridade em praticamente todo o território nacional, um robusto programa nacional de habitação, uma base de 140 milhões de clientes, principalmente entre a população mais pobre, e agora é também um banco digital.

Isso quer dizer que, caso algum governo no futuro queira utilizar a Caixa para fins políticos, distribuindo verbas por meio de patrocínios ou crédito e influenciando nas eleições a nível municipal, estadual, ou até nacional, será possível fazê-lo, com ainda mais força e influência do que no passado.

Para minimizar esse risco, a atual gestão está avançando na abertura de capital de alguns ativos como Caixa Seguridade e Caixa Cartões. Mesmo assim, o risco de corrupção e uso político sempre existirá. No entanto, o que temos hoje de concreto é que a Caixa Econômica executa um papel social fundamental que, pelo menos neste momento, não conseguiria ser desempenhado pela iniciativa privada.

Considerando o nível de pobreza ainda existente em tantas partes do Brasil, o Estado não poderia prescindir de ter um banco social para atender essa população mais vulnerável. Por isso, acredito que todas as outras estatais são dispensáveis, mas a Caixa, pe​lo menos por enquanto, deveria ficar de fora dessa lista.

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