Gregorio Duvivier

É ator e escritor. Também é um dos criadores do portal de humor Porta dos Fundos.

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Gregorio Duvivier
Descrição de chapéu

Quem sabe em 2021 o século 20 consegue finalmente virar 21

Quem viveu o flop do ano 2000 não chegou a cogitar que não se termina um século assim, em fade out

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Nem todo ano termina quando acaba. Se 1968 foi o ano que não terminou e 1958 foi o ano que não devia terminar, 2020 é o ano que não vai terminar tão cedo. Não se termina nada, quanto mais um ano, sem que se possa abraçar desconhecidos.

Adiamos até a Olimpíada, precisamos adiar esse Réveillon e, mais ainda, o Carnaval. Estamos acostumados a prorrogações: do metrô à reforma agrária, tudo nesse país foi adiado —ou, pelo menos, tudo o que presta.

A Inconfidência só foi descoberta porque foi adiada. A abolição, a reabertura política, tudo por aqui foi empurrado com a barriga até que não fosse mais possível empurrar. Vamos dar aquela abrasileirada e deixar a virada lá pro meio do ano: é mais fresquinho, mais seguro e deve coincidir com uma virada de fato —talvez ali algo novo, então, possa nascer.

Colagem com foto de Gregorio Duvivier usando um chapéu de papel com o rosto apoiado em uma mão
Publicada nesta quarta-feira, 30 de dezembro de 2020 - Catarina Bessel/Folhapress

Os séculos, por serem feitos de anos, se comportam como eles. O século tampouco termina no tempo regulamentar. Tem séculos que vão pra prorrogação. O século 20 nasceu, ironicamente, com quase 20 anos de atraso, com a Primeira Guerra Mundial e uma pandemia que matou mais que a guerra e permitiu que tudo mudasse de verdade: a Revolução Russa, o surrealismo, o cubismo, o fascismo e tudo o que caracterizaria o século 20.

Outros séculos terminam antes da hora. O século 18 acabou 11 anos antes do fim, com a Revolução Francesa. O século 19 durou muito mais que um século, assim como a meia hora brasileira, que dura uns 45 minutos ou meia meia hora a mais que a meia hora mundial.

Cresci achando que tudo mudaria no ano 2000, quando o bug do milênio formataria todos os computadores. Chegaram a estocar comida com medo de uma crise “pior que 1929”.

O milênio virou e acabou não mudando grandes coisas. Quem viveu o flop do ano 2000 não chegou a cogitar que não se termina um século assim, em fade out. Muitos pensaram que o século já tinha acabado em 1989, com a queda do Muro de Berlim —mas seria um final muito chocho.

Esse século pedia um final à sua altura —viral, global e letal.

O século 20, por ter demorado a nascer, se recusou a morrer no tempo regulamentar e precisou desse lamentável pós-créditos. O que vemos, esse show de horrores, esse empilhamento de corpos, pode ser o parto de um século. Quem sabe, em 2021, o século 20 consegue, finalmente, virar 21.

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