Guilherme Boulos

Professor, militante do MTST e do PSOL. Foi candidato à Presidência da República e à Prefeitura de São Paulo.

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Guilherme Boulos

Duas faces da moeda

Não há comparação entre quem agride jornalistas com quem questiona a parcialidade da imprensa

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A campanha eleitoral ainda nem começou, mas a narrativa que Bolsonaro e a esquerda são duas faces da mesma moeda já tem sido utilizada despudoradamente por ideólogos liberais e setores da imprensa. Reclamam, com certo ar de impotência, da polarização nacional entre dois extremos e advogam um caminho do meio.

Antes de mais nada, é preciso dizer que o Brasil é polarizado há 500 anos. Um país marcado a ferro por três séculos de escravidão e por uma das piores distribuições de renda do planeta cria um abismo entre cidadãos e subcidadãos, para usar o termo de Jessé Souza. Não há como esperar um padrão de convivência dinamarquês numa sociedade tão desigual e violenta. E é evidente que isso transborda para a política.

O fato de a política brasileira dos dias atuais estar conflagrada, ameaçando a democracia, não se deve, stricto sensu, à polarização, e sim ao autoritarismo e à intolerância. Nesse ponto, não há sinal de equivalência possível. As responsabilidades são claras e vêm de um único extremo, que é o bolsonarismo.

Não há como comparar as ameaças feitas por Bolsonaro de destituir ministros do Supremo e de fechar o Congresso com posições críticas da esquerda à judicialização da política e ao sistema viciado de governabilidade. Não existe comparação entre quem agride e humilha jornalistas diariamente e aqueles que questionam a parcialidade de órgãos de imprensa. A esquerda brasileira nunca ameaçou cancelar as eleições nem promoveu desfile de tanques na Esplanada dos Ministérios.

Não são duas faces da mesma moeda. A existência da polarização política não significa equivalência entre as partes. Allende e Pinochet não eram duas faces da mesma moeda. Nem Hitler e o KPD. Nem Mussolini e Antonio Gramsci. De um lado está o autoritarismo, a tortura e a desumanidade. De outro, a democracia, a defesa da justiça social e o respeito à diversidade.

O Brasil está num dos momentos mais críticos de sua história. Temos no comando alguém que desprezou a morte de mais de meio milhão de pessoas e que arquiteta, aos olhos incrédulos da nação, uma estratégia golpista para se manter no posto. Ele não dá nenhum sinal de recuo, e, a essa altura, é difícil imaginar que possa fazê-lo.

Entendo que seja tentador aos liberais, hoje com pouca base eleitoral, querer jogar no mesmo balaio seus opositores à direita e à esquerda. Mas é de uma indecência sem igual. É legítimo que a direita tradicional brasileira queira emplacar seus representantes e defender sua agenda, que, em resumo, significa manter a política econômica de Bolsonaro sem seus extremismos políticos. Que, porém, o faça com decência.

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