Bastou Lula elogiar a revogação da reforma trabalhista na Espanha, conduzida pela vice-presidente Yolanda Diaz, para que a gritaria começasse. Editorialistas, economistas liberais e os porta-vozes do mercado partiram para o ataque. Até mesmo Michel Temer, que hoje divide o tempo entre conselhos a Bolsonaro e jantares com imitações, escreveu um artigo nesta Folha para defender sua fracassada reforma.
A reforma brasileira de 2017 foi um verdadeiro desastre. Entre mais de 300 mudanças, criou o trabalho intermitente, que aumenta a insegurança no emprego, liberou a terceirização para todas as atividades e enfraqueceu o poder de negociação dos trabalhadores, com a ficção de igualdade de condições entre empregadores e empregados.
Retirou direitos conquistados há 80 anos, com a CLT de Vargas. Temer nega a óbvia perda de direitos com um sofisma infantil, alegando que os direitos do trabalhador estão assegurados na Constituição. Papel aceita tudo. Quero ver ele explicar isso a quem ganha menos de um salário mínimo, sem direito a férias nem décimo-terceiro, limpando balcão de bar num contrato intermitente.
Os números, meus caros, não costumam mentir. A promessa de gerar 2 milhões de empregos até 2019 virou pó. O discurso de redução da informalidade foi desmentido de forma dramática: de 37,3 milhões de trabalhadores em 2017 para 39,3 em 2019. A falsa oposição entre empregos e direitos, vendida a pessoas em desespero, levou a mais desemprego e menos direitos. Se isso é a "modernização", chegou a hora de repensar os rumos que estamos seguindo.
Foi isso que fez a Espanha, revendo a reforma que os neoliberais de lá haviam feito em 2012 e que havia sido, vejam só, modelo para a reforma brasileira. O foco agora foi limitar os contratos temporários, estabelecer a igualdade salarial entre terceirizados e empregados diretos e fortalecer os mecanismos de negociação coletiva.
Além disso, como bem pontuou Mathias de Alencastro, a proposta espanhola buscou entender as mudanças nas relações de trabalho com a uberização, o aumento do home-office e do trabalho autônomo, estabelecendo regulamentações para essas modalidades, que garantam direitos aos trabalhadores. Isso sim é modernização.
A sinalização de Lula pela revogação da reforma é um passo importante. Esperamos que seja levada adiante e que vá além, com a revogação do igualmente desastroso Teto de Gastos, que retirou dinheiro do SUS e de áreas sociais, engessando a capacidade de investimento do Estado brasileiro. Precisamos não apenas de um novo governo, mas de um novo modelo, que permita ao Brasil crescer com respeito aos trabalhadores e combate às desigualdades sociais.
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