Helio Beltrão

Engenheiro com especialização em finanças e MBA na universidade Columbia, é presidente do instituto Mises Brasil.

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Helio Beltrão

A moeda do grande camarada

Dinheiro digital chinês é intrusão bárbara na privacidade

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Em quatro cidades chinesas está em andamento um programa-piloto do governo para implementação de um dinheiro digital estatal, com status de aceitação legal similar ao da moeda nacional.

Embora os chineses sejam pioneiros, 40% dos bancos centrais do mundo têm projetos avançados de dinheiro digital, e 10% declararam que devem lançá-lo nos próximos três anos, segundo o BIS (Bank for International Settlements).

Desde a década de 1970, o dinheiro do mundo não é mais predominantemente físico, mas compreende dígitos eletrônicos nas telas de computador e caixas eletrônicos que representam os saldos em conta-corrente.

Há séculos, a natureza do dinheiro tem migrado de materialidade física para maior abstração conceitual. O dinheiro digital é apenas um passo adicional nessa migração inevitável.

Passageira paga ônibus com sistema Alipay, via smartphone, em Hangzhou, na China - Xu Kangping-16.ago.16/Xinhua

Cerca de 600 milhões de chineses regularmente usam seus celulares para efetuar pagamentos digitais descomplicados por meio das plataformas WeChat (equivalente ao WhatsApp) e Alipay (do Alibaba, varejista digital). No entanto, a introdução do renminbi (ou yuan) digital é um bicho bem diferente.

Pagamentos por WeChat e Alipay são mais eficientes do que transferências bancárias, mas requerem vinculação a uma conta bancária ou cartão de crédito.

Não obstante a ampla aceitação, sempre haverá lojistas ou indivíduos que recusarão pagamento via WeChat/Alipay por considerá-lo inferior a dinheiro vivo, cartão de crédito ou débito. Por outro lado, o dinheiro digital estatal terá aceitação obrigatória por lei.

Ademais, WeChat e Alipay são dependentes da conexão por internet: sem sinal, não há compra e venda. No caso do dinheiro digital, bastará um toque físico entre os celulares para efetuar a transação offline. O pré-requisito é possuir o aplicativo da carteira digital do banco central chinês, que, por sua vez, dispensará vinculação obrigatória a um banco ou cartão de crédito.

O dinheiro digital chinês será originado da mesma forma que o atual papel-moeda. O banco central fornecerá o dinheiro digital aos bancos, e os clientes o sacarão de sua conta-corrente, caso desejarem.

Dessa forma, o correntista trocará seu saldo em conta-corrente por dinheiro digital e vice-versa, sem alteração na base monetária (reservas bancárias são a contrapartida do dinheiro digital).

Em suma, em termos legais e de ordem prática, o dinheiro digital será quase indistinguível do papel-moeda, com algumas diferenças.

O Partido Comunista chinês poderá acompanhar em tempo real o volume e a características das transações e ao menos em tese terá a prerrogativa de rastrear todas as contrapartes de transações, bem como seus hábitos de consumo. Essa parece ser a motivação principal do PCC, já que o papel-moeda ainda representa 15% do total de dinheiro.

No Ocidente, dificilmente se adotará solução tecnológica que permita essa intrusão bárbara na privacidade. A ideia chinesa se assemelha à proposta da deputada de esquerda Tabata Amaral, que propõe o controle estatal em conversas privadas de WhatsApp.

Alguns imaginaram que o dinheiro digital chinês pode ameaçar a hegemonia do dólar. Bobagem. Os comunistas são obcecados por controle e não permitem que o yuan seja uma moeda de livre convertibilidade. Consequentemente, está presente em apenas 4% das transações de moeda no mundo, 2% das reservas internacionais e 2% dos pagamentos globais, ante 88%, 62% e 40% do dólar, respectivamente.

O dólar continuará a liderar nas próximas décadas. Há mais chance de que uma criptomoeda como o bitcoin ou a Libra, do Facebook, ameace sua hegemonia no futuro do que uma moeda gerida pelo Partido Comunista chinês.​

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