Helio Beltrão

Engenheiro com especialização em finanças e MBA na universidade Columbia, é presidente do instituto Mises Brasil.

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A nota de R$ 200 não é o problema; a inflação é

A chegada do lobo-guará está distraindo a opinião pública do verdadeiro problema: o estado gastador

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Enxadristas utilizam costumeiramente a manobra de diversionismo, cujo propósito é “distrair” o adversário e induzi-lo a desguarnecer uma casa vital para o desenrolar do jogo. Apresenta-se como ameaça imediata, mas muitas vezes revela-se inócua.

Na política e na comunicação institucional, é equivalente ao factoide. Não é um fato determinante em si, mas parece. Muitas vezes os factoides são lançados por políticos, tal qual um balão de ensaio, com o mesmo objetivo da manobra de diversionismo no xadrez. Outras vezes são autogestados por uma percepção pública equivocada.

Este último é o caso da vindoura nota de R$ 200, o lobo-guará, que logo depois de anunciada foi tachada pelos críticos do governo como prenúncio de futura inflação. Isso é falso.

A inflação chegou antes do lobo-guará: o IGP-M subiu 2,2% em julho e acumula 9,3% de alta nos últimos 12 meses. O índice, mais volátil que o IPCA, serve usualmente como indexador de reajuste de aluguéis, dos planos de saúde, da mensalidade de escolas, de energia elétrica e de telefonia. Apura preços de cerca de 1.400 itens, ante 350 apurados no IPCA, o índice oficial.

Em janeiro, o mercado estimava um IGP-M de 4,3% em 2020, mas já atingimos alta de 6,7% até julho. É inflação de gente grande, mas nas manchetes figura a nota de R$ 200.

O público, distraído, permanece com foco no IPCA. Meta oficial de inflação há décadas, deixou de ser um bom medidor da carestia sofrida pelo brasileiro comum, ao ser manipulado por desonerações e outros truques.

Analistas apontaram nos últimos dias que R$ 100 no início do Plano Real compravam US$ 100 e hoje compram apenas US$ 19 e que a cesta básica em São Paulo custava R$ 68 em 1994, ante mais de R$ 500 hoje. Porém, poucos mencionaram o aumento brutal do dinheiro em circulação (M1) promovido pelo Banco Central desde março, que passou de R$ 410 bilhões em fevereiro para R$ 540 bilhões em julho, aumento superior a 30%.

O auxílio emergencial contribuiu para essa elevação, bem como o entesouramento —em épocas de incerteza as pessoas preferem ter em mãos dinheiro em espécie.

Com a demanda crescente por dinheiro durante a pandemia acompanhando a oferta, é natural que a inflação não se reflita em índices de preços, mas isso pode mudar rapidamente assim que a demanda por dinheiro volte aos níveis normais.

O BC afirma que a entrada dos lobos-guará não expandirá ainda mais a base monetária. Subentende-se, portanto, que pretende trocar cédulas: menos cédulas, menor custo para o BC.

Se for verdade, o problema não vem das novas notas em si, mas da expansão monetária, que já está em curso antes mesmo delas. A inflação derivada dessa expansão é um imposto invisível, que pune particularmente os mais pobres.

O saudoso Joelmir Beting dizia que a “economia, ciência severa da escassez, enquadra a política, utopia alegre da abundância”. Infelizmente, a política populista atual prevalece sobre o conhecimento econômico.

A chegada do lobo-guará está distraindo a opinião pública do verdadeiro problema: o estado gastador. A subida do IGP-M enfatiza a urgência do controle de gastos públicos, mesmo diante de todas as dificuldades causadas pela pandemia. Não se trata, obviamente, de reduzir o apoio aos mais necessitados, mas de acelerar as privatizações, a reforma administrativa e o enxugamento da máquina.

O leitor pode se perguntar: “A inflação está aumentando ou é impressão minha?”. Atenção ao factoide: a impressão é do BC mesmo.

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