Helio Beltrão

Engenheiro com especialização em finanças e MBA na universidade Columbia, é presidente do instituto Mises Brasil.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Helio Beltrão
Descrição de chapéu União Europeia Europa

Euro chega aos 20 anos melhor para uns do que para outros

Crença era que, ao ter moeda comum, nações distintas convergiriam em mentalidade

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Há 20 anos começavam a circular as notas de euro. É a primeira moeda pós-moderna, uma metamoeda não lastreada em uma base de impostos, um governo, ou um exército. Pura abstração.

O euro foi o projeto de poder geopolítico do socialista Jacques Delors, que ansiava por conter a potência econômica da Alemanha reunificada bem como confrontar a supremacia dos EUA e do dólar.

Nos seus primeiros anos, foi notável o avanço propiciado por uma moeda comum. Com a eliminação dos custos de câmbio e a transparência de preços, o comércio entre países prosperou. Os países periféricos se beneficiaram e enriqueceram, como na era do padrão-ouro, durante a qual virtualmente o mundo inteiro usava a mesma moeda.

Notas de euro são exibidas no Museu do Dinheiro do Banco Central Austríaco em Viena, Áustria
Notas de euro são exibidas no Museu do Dinheiro do Banco Central Austríaco em Viena, Áustria - Heinz-Peter Bader-14.nov.17/Reuters

Porém, assim como o monstro Frankenstein de Mary Shelley, o euro era uma ideia meio amalucada de unir órgãos e tecidos vitais (pesetas, escudos, dracmas, florins, coroas e marcos), alguns saudáveis, outros menos, em uma criatura estéril que ganhou vida.

Convenientemente se desconsiderou que alguns desses órgãos possuíam histórico de falências múltiplas, guerras civis e inflação galopante. A crença ingênua era que, ao possuir um dinheiro comum, as nações completamente distintas convergiriam em mentalidade. Ou seja, torcia-se para que os gregos se tornassem responsáveis e poupadores como os alemães. Não rolou.

Ao fim da primeira década de existência, o histórico de irresponsabilidade veio à tona. Durante a crise da dívida soberana (2009-2011), os governos dos países que compunham a sigla Pigs (Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha) não conseguiam pagar e refinanciar suas dívidas ou socorrer os bancos de seus países. O BCE (Banco Central Europeu) terminou socorrendo a todos com a criação de uma montanha de novos euros, por meio de um artifício no qual os países ricos, principalmente a Alemanha, afiançam os maus pagadores.

Esse tipo de socorro, no entanto, se assemelha mais a política fiscal e econômica do que a política monetária: não era esse o mandato do euro. Mas, para enfrentar a crise existencial, apoiou-se o lema de Mario Draghi, então presidente do BCE: "Fazer tudo que for preciso".

A criatura sobreviveu.

Uma agenda escondida de Delors e de seus descendentes ideológicos era que o euro facilitaria a integração política na Europa (um macroestado central em Bruxelas) e a implementação do socialismo pela porta de trás: como no trocadilho da Thatcher, "socialism through the back Delors".

O socialista fabiano Bernard Shaw dizia que "o governo que promete roubar de Pedro para dar a Paulo pode sempre contar com o apoio de Paulo". Uma moeda comum com um Estado central viabiliza a contínua expropriação dos Pedros pelos Paulos, a tara redistributiva dos socialistas.

Porém o euro, pelo menos até 2020, se revelou paradoxalmente um obstáculo à ideia de Delors. Keynes dizia que o padrão-ouro "algema os ministros da Economia"; o euro gera o mesmo efeito. Antes, em crises financeiras, os governos adiavam reformas e geravam inflação e desvalorização da moeda. Agora, o truque de desvalorizar para ocultar irresponsabilidades foi abolido. A única saída passou a ser lidar com os investidores e colocar as contas em dia. Não é à toa que populistas de esquerda e direita querem enterrar o euro. Se esquecem de que, se desvalorizar fosse bom, Venezuela, Zimbábue e Argentina seriam ricas, e a Suíça, pobre.

Os alemães tentaram garantir na partida que o euro tivesse boa gestão monetária, com o BCE focando exclusivamente a estabilidade de preços. As coisas mudaram desde então e, dadas a inflação atual e as novas metas do BCE de combater mudanças climáticas e resgatar governos irresponsáveis, os frugais alemães talvez já estejam arrependidos desse experimento monetário.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.