Para quem gosta de linguística, uma boa pedida é “How Language Began” (como a linguagem surgiu), de Dan Everett.
O livro, como seu autor, é profundamente polêmico. Everett veio para o Brasil nos anos 70 como um misto de linguista e missionário, mas logo se destacou como especialista em idiomas amazônicos, notadamente o falado pelos pirahãs com os quais viveu por longos períodos. Nos anos 90, Everett renunciou ao cristianismo e, na década seguinte, ganhou manchetes atacando a teoria da gramática universal, proposta por Noam Chomsky, que goza de sólido prestígio na academia.
Para simplificar um debate complexo, a língua pirahã, diz Everett, não tem recursividade (a capacidade de gerar um número em tese infinito de frases gramaticais), o que violaria o núcleo da teoria chomskyana.
Para Everett, é bobagem afirmar, como fazem Chomsky, Steven Pinker e outros, que as línguas variam dentro de parâmetros mais ou menos fixos e que seres humanos contam com uma espécie de instinto da linguagem, que teria possivelmente surgido com uma mutação genética entre 100 mil e 50 mil anos atrás.
É aí que entra o novo livro. Se a linguagem não é um desenvolvimento evolutivo relativamente recente, como ela apareceu? Para Everett, ela vem sendo esculpida culturalmente há muito tempo e não apenas pelo Homo sapiens. O autor afirma que há evidências suficientes para concluir que o Homo erectus já contava com uma forma não trivial de linguagem cerca de 1,9 milhão de anos atrás.
Embora essa afirmação deixe a maior parte dos paleontólogos de cabelo em pé, Everett oferece no livro vários argumentos e indícios que apoiam suas ideias. Não penso que seja tão simples desbancar a gramática universal (há muita coisa sólida por trás dessa teoria), mas certamente é importante que ela seja cutucada e questionada. É assim, afinal, que a ciência evolui.
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