Hélio Schwartsman

Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Hélio Schwartsman
Descrição de chapéu

A estranha ordem das coisas

António Damásio tira definitivamente a homeostase do campo da fisiologia

O português António Damásio, durante passagem pela capital paulista, em 2013
O português António Damásio, durante passagem pela capital paulista, em 2013 - Karime Xavier - 26.jun.2013/Folhapress

Se há um conceito que ganhou prestígio na ciência nas últimas décadas é o de homeostase, o sistema de regulação das funções corpóreas de um organismo.

Descrita pela primeira vez por Claude Bernard em 1865 e batizada por Walter Bradford Cannon em 1926, a homeostase foi de início vista como um conjunto de “termostatos” que visava a manter em equilíbrio parâmetros vitais tão variados como temperatura corporal, níveis de glicose, íons, balanço de fluidos, pH sanguíneo etc. Enfim, era coisa que só interessava a médicos e biólogos.

Não demorou, porém, para que se percebesse que a homeostase era quase uma definição de vida, e o conceito foi ganhando estatura filosófica. Em “A Estranha Ordem das Coisas”, o neurologista português António Damásio radicaliza essa guinada.

Ele tira definitivamente a homeostase do campo da fisiologia apenas para colocá-la como fundação da consciência e da própria cultura, compreendida como a coleção de objetos, práticas e ideias de um grupo. E como a homeostase faz isso? Ela se vale de seus mensageiros mentais, os sentimentos —basicamente dor e sofrimento, de um lado, e prazer e bem-estar, do outro—, que operam como motivos para as ações de indivíduos de diferentes espécies.

É a busca da homeostase, pelos mecanismos mais obviamente fisiológicos ou pelos psicológicos, que leva os organismos a florescer, alimentando-se, procriando e eventualmente desenvolvendo culturas.

O interessante na teoria de Damásio é que ela reduz a distância que separa humanos de outros representantes dos animais e até dos de outros reinos, como as bactérias (o autor mostra que elas também aderem a práticas que poderíamos chamar de culturais). É uma linha interessante, em especial quando se considera que quase tudo que já nos foi vendido como característica unicamente humana acabou se mostrando menos exclusivo do que se pensava.

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.