Hélio Schwartsman

Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

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Hélio Schwartsman

A baleia, o gênero e os jovens

Projeto do Escola Sem Partido não é apenas inepto e burro, mas também equivocado

Sala de aula em escola municipal Santana de Parnaíba (SP); projeto de lei quer proibir o uso da palavra 'gênero' em todas as disciplinas
Sala de aula em escola municipal Santana de Parnaíba (SP); projeto de lei quer proibir o uso da palavra 'gênero' em todas as disciplinas - Joel Silva -12.dez.12/Folhapress

Qual frase é a certa: “a baleia macho perseguiu o filhote” ou “a baleia macha perseguiu o filhote”? A maioria dos gramáticos prefere a primeira construção. Mas “maioria” não significa “todos”.

Napoleão Mendes de Almeida, de longe o mais conservador de nossos filólogos, insiste na segunda formulação. Ele tem um argumento singelo. A regra geral das línguas flexivas estabelece que adjetivos concordam em gênero, número e caso com o substantivo que modificam. Como “baleia” é um substantivo feminino, diz Napoleão, o adjetivo que o determina, não importa qual seja, também vai para o feminino. O resultado são formas como “baleia macha”, “tatu fêmeo” e “mulher macha”.

O Escola Sem Partido (ESP), o consórcio entre a bancada da Bíblia e militantes direitistas, patrocina um projeto de lei que, entre dispositivos que vão do anódino ao maluco, proíbe o uso da palavra “gênero” em todas as disciplinas (pelo menos foi isso o que concluí da confusa redação do substitutivo ao PL 7.180/14).

Se esse estrupício for mesmo aprovado, Napoleão teria dificuldades para explicar seu sistema de concordância para substantivos epicenos. “Gênero”, afinal, designa não apenas a diferenciação cultural entre homens e mulheres, empregada na tão temida “ideologia de gênero”, mas também uma categoria gramatical (masculino, feminino ou neutro) e um grupo taxonômico (reino, filo, classe, ordem, família, gênero, espécie). Professores de idiomas e de biologia teriam de fazer malabarismos para ensinar sob a proibição do uso do termo.

O projeto do ESP, porém, não é apenas inepto e burro. Ele é também equivocado. Ao pretender que pais tenham uma espécie de poder de veto sobre o que é ensinado aos seus filhos, priva a educação de uma de suas principais funções, que é a de dar aos jovens elementos para que formem suas próprias convicções, que não precisam ser idênticas às de seus genitores. A tarefa da escola é expor o jovem ao mundo.

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