Hélio Schwartsman

Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

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Hélio Schwartsman

A guerra do cocô

Indústria farmacêutica investe em transplantes de fezes para curar doença que mata 30 mil ao ano nos EUA

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São Paulo

O tema de hoje é ainda mais escatológico do que o proposto por Jair Bolsonaro no Carnaval. O cocô, mais especificamente as fezes utilizadas num procedimento médico, deve ser considerado uma droga ou está mais para um análogo da doação de sangue?

A pergunta opõe companhias farmacêuticas a médicos que realizam o chamado transplante de fezes, que já se mostrou um tratamento bastante eficaz para casos de colite provocada por Clostridium difficile. Nos EUA, a doença acomete 500 mil pacientes por ano e mata 30 mil, como mostrou reportagem do The New York Times.

Cultura de bactérias fecais
Cultura de bactérias fecais - Kayana Szymczak/The New York Times

Na versão artesanal, o transplante consiste em recolher os dejetos do doador (normalmente um parente próximo) e liquefazê-los com solução salina. A mistura é então levada até o trato intestinal do receptor através de enemas. A hipótese teórica é que a flora saudável do doador agirá como um probiótico, colonizando o intestino e desalojando o C. difficile.

Laboratórios querem pôr as fezes numa pílula e tratá-las como uma droga, com direito a proteção patentária. Reguladores dos EUA estão inclinados a permitir. Conceitualmente, não penso que o cocô seja patenteável. Não vejo mal em deixar que a indústria o embale em drágeas e coloque no mercado, mas me parece demais conceder-lhe direitos exclusivos sobre o tratamento.

E o C. difficile é só o começo. Vão se avolumando evidências de que as populações de bactérias que compõem nosso microbioma, e podem ser modificadas com transplantes fecais, têm papel relevante numa série de moléstias, inclusive psiquiátricas, e na obesidade. Cientistas já conseguiram interferir no peso de ratos manipulando sua flora.

Uma pílula emagrecedora que funcione de verdade teria valor incalculável. Se ela contiver uma molécula nova, é justo que o laboratório que a descobrir fature, mas, se for só merda, dá para afirmar com segurança que ela já caiu em domínio público.

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