Embora a origem das línguas tenha inspirado textos belíssimos de autores como Rousseau e Condillac, a questão era tratada de forma tão selvagemente especulativa que, em 1866, a Sociedade Linguística de Paris decidiu bani-la de seus debates. Até o fim do século 20, o tema permaneceu mais ou menos tabu nos meios linguísticos respeitáveis. Não mais.
"The Dawn of Language" (a aurora da linguagem), de Sverker Johansson, retoma, agora com base em evidências, essa discussão. O que faz a diferença são desenvolvimentos não só no campo da linguística, que agora oferece teorias capazes de produzir hipóteses falseáveis, como também da paleoantropologia, neurociência, arqueologia e etologia dos primatas. Uma boa teoria sobre a origem das línguas precisa explicar não só por que o homem fala mas também por que os chimpanzés, com os quais partilhamos 98% do DNA, não o fazem.
Johansson é um físico convertido em linguista. Seu livro não nos poupa de debates sobre paradigmas. Ele próprio é um funcionalista, corrente que se opõe tanto ao gerativismo de Noam Chomsky como ao conexionismo. Mas o leitor pode ficar tranquilo. Embora a discussão possa ficar complicada, Johansson é obsessivamente didático, a ponto de explicar o que são substantivos.
Para o autor, a chave é a intencionalidade conjunta. Por imperativos da biologia, nós dependemos muito mais de nossos semelhantes do que os outros primatas. A mulher precisa de ajuda para dar à luz, enquanto a chimpanzé se esconde no mato para fazê-lo sozinha. Isso fez com que já o Homo erectus desenvolvesse uma protolinguagem, 1,8 milhão de anos atrás. A necessidade de cooperação exerceu uma pressão seletiva tão exacerbada que evoluímos de modo a transformar a protolinguagem em idiomas recursivos regidos por estruturas gramaticais.
Eu achei tudo isso fascinante. Mas talvez eu não seja um bom parâmetro. Também tinha achado Rousseau fascinante.
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