A crise na Ucrânia produz um efeito túnel do tempo. Não pensei que veríamos mais um ditador ordenando um ataque a um país vizinho em busca de "Lebensraum" (espaço vital). Também não achei que veríamos cidadãos do gênero masculino do país invadido sendo impedidos de deixar a zona de conflito, porque são considerados conscritos para o serviço militar.
Sim, indivíduos foram separados de suas famílias e podem ser obrigados a lutar, mesmo que não o desejem. No caso da Ucrânia, isso é ainda mais problemático, porque um número não desprezível dos nacionais se identifica mais com os russos que com os ucranianos. Recrutá-los à força pode significar infiltrar as forças armadas com quintas-colunas.
O serviço militar obrigatório é uma relíquia bárbara. A maioria das democracias liberais já o extinguiu, mas ele segue vivo, ainda que esvaziado, em países como Ucrânia e Brasil.
A substituição do recrutamento pelo serviço profissional é obra de economistas, mais especificamente do trio composto por Milton Friedman, Walter Oi e Martin Anderson. Foram eles que convenceram Nixon de que o serviço obrigatório era uma aberração ética (obrigava pessoas a fazer o que não queriam), que não fazia nenhum sentido econômico (o custo de tirar jovens de suas carreiras superava o de contratar um exército profissional) e provavelmente também não militar (voluntários tendem a render mais do que compelidos).
Um diálogo de 1970 entre Friedman e o general William Westmoreland na comissão criada para debater o assunto resume bem o clima da época. "Eu não gostaria de comandar um exército de mercenários", declarou o militar. "Então, general, o senhor prefere comandar um exército de escravos?", retorquiu o economista. A proposta de profissionalizar as forças armadas foi aprovada por unanimidade na comissão e, um ano depois, depois transformada em lei, sob os auspícios de Nixon e de boa parte da esquerda.
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