Ian Bremmer

Fundador e presidente do Eurasia Group, consultoria de risco político dos EUA, e colunista da revista Time.

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Merkel enfraquecida é má notícia para a Europa e o mundo

Coalizão da chanceler alemã afeta planos de reforma e defesa dos ideais da União Europeia 

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A chanceler alemã, Angela Merkel, faz comunicado à imprensa na sede de seu partido em Berlim
A chanceler alemã, Angela Merkel, faz comunicado à imprensa na sede de seu partido em Berlim - John MacDougall - 5.mar.2018/AFP

Depois de cinco meses sem governo, membros do Partido Social Democrata da Alemanha (SPD), de centro-esquerda, agora votaram por aderir a mais uma coalizão liderada pela chanceler Angela Merkel. 

Não havia uma grande sensação de urgência na Alemanha. Sua economia continua crescendo, e sua política é estável. Mas a fraqueza de sua última “grande coalizão” é uma má notícia para a Europa e para o mundo. 

A Europa precisa de liderança, e Emmanuel Macron, da França, precisa de um parceiro forte para a reforma da zona do euro. Em nível global, valores liberais como respeito pelo Estado de direito, os direitos humanos, os mercados abertos e fronteiras abertas precisam de um defensor. 

A Alemanha, assim como os EUA, está longe de ser um mensageiro perfeito sobre essas questões, mas, com Donald Trump promovendo a “América em primeiro lugart”, Xi Jinping eliminando os limites de mandato na China e homens-fortes surgindo em vários países, Angela Merkel ainda é a melhor defensora desses valores. Sua tarefa só ficou mais difícil. 

Muita coisa mudou na Alemanha nos últimos cinco anos. A nova coalizão obteve 53% dos votos na eleição em setembro passado, contra 67% na votação anterior em 2013. Pesquisas recentes sugerem que a porcentagem poderá cair abaixo de 50% se outra votação for feita hoje. 

Uma pesquisa de fevereiro colocou o SPD abaixo da Alternativa para a Alemanha (AfD), de extrema-direita, que hoje serve como principal partido de oposição no país. 

Os membros do SPD votaram com uma margem de 2 a 1 pela adesão ao novo governo, mas a juventude do partido fez campanha contra essa ideia, e até os que votaram sim parecem tê-lo feito sem muito entusiasmo.

Uma Alemanha politicamente enfraquecida é má notícia para a Europa, porque uma Merkel diminuída deixará a UE sem uma liderança forte numa época em que a reforma está muito na agenda. 

Macron propôs reformas abrangentes destinadas a reforçar a zona do euro e contrabalançar o nacionalismo rancoroso com políticas comuns a toda a UE sobre defesa, impostos e regras de asilo. 

Ele pediu um Parlamento da zona do euro, ministros da zona do euro, um orçamento da zona do euro, melhor coordenação em política fiscal e uma abordagem comum aos controles de fronteira. 

Mas Macron precisa do forte apoio de Merkel para garantir que os líderes do Conselho, da Comissão, do Parlamento e do Banco Central europeus possam concordar com esses planos antes que todos sejam substituídos em 2019.

Não é só a Europa que precisa da forte liderança política da Alemanha. Quando Donald Trump venceu a eleição presidencial nos EUA, Merkel não tentou compensar a falta de experiência dele, o temperamento instável, o protecionismo e a retórica anti-imigração da campanha. 

Em vez disso, ela ofereceu congratulações com uma clara visão dos termos em que os dois líderes e os dois governos poderiam trabalhar juntos com sucesso: “A Alemanha e os EUA são ligados por valores comuns —democracia, liberdade, assim como respeito pelo Estado de direito e a dignidade de cada pessoa, independentemente de sua origem, cor da pele, crença, gênero, orientação sexual ou opiniões políticas”, escreveu ela. “É com base nesses valores que eu quero lhe oferecer uma estreita colaboração, comigo pessoalmente e entre os governos de nossos países.”

Enquanto as palavras e os atos de Trump afastaram a política dos EUA da promoção e defesa desses valores —embora Washington sempre tenha atuado sobre eles de maneira imperfeita e incoerente—, a voz de Merkel só se tornou mais importante. 

Sua recusa a fazer compromisso sobre os ideais que definiram a União Europeia —a livre movimentação de bens, serviços, dinheiro e pessoas—, sua recepção aos refugiados, o apoio à própria UE —o projeto político mais ambicioso e idealista da história humana— e sua rejeição às tendências populistas/nacionalistas que cada vez mais definem a política de um número crescente de países influentes só se tornaram mais importantes.

Mas agora ela irá liderar um governo que deve responder a perguntas e desafios colocados não só pela centro-esquerda, mas também pela extrema-direita. Sua posição mais fraca no país tornará mais difícil oferecer concessões e mediar compromissos na Europa e em outros lugares. A UE será muito mais vulnerável a futuras crises e será mais difícil defender os valores liberais ocidentais.

Merkel não está acabada. Enquanto ela inicia seu quarto e último mandato como chanceler alemã, seu partido continua sendo o mais forte da Alemanha, e ela tem mais popularidade que o partido. A economia alemã continuará se expandindo. Infelizmente, a Europa e o mundo precisam de mais liderança do que um Donald Trump frustrado e errático e uma Angela Merkel enfraquecida podem oferecer.

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