Ian Bremmer

Fundador e presidente do Eurasia Group, consultoria de risco político dos EUA, e colunista da revista Time.

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Provocações de Trump à China agradam vizinhos do país asiático

Foco da atenção de Pequim permanece firme sobre a hegemonia chinesa na Ásia

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Independentemente do estado atual da guerra comercial entre Estados Unidos e China, a geopolítica da Ásia está rapidamente se tornando mais contenciosa. Na cúpula do G20 em Buenos Aires, os presidentes dos EUA, Donald Trump, e da China, Xi Jinping, podem ter feito algum progresso em direção a uma resolução, mas tanto a substância quanto o timing das próximas ações permanece em dúvida, e existe um risco real de que Trump, que precisa de uma vitória política em casa, vá simplesmente declarar vitória e se afastar, sem resolver as origens de longo prazo do conflito.

Enquanto isso, sua política externa de “a América em primeiro lugar” e sua disposição de empreender ações comerciais contra aliados dos EUA na região, ao mesmo tempo em que provoca novas brigas com Pequim, criaram mais espaço para a China, cada vez mais ambiciosa, ampliar sua influência comercial e política.

Os presidentes americano, Donald Trump, e chinês, Xi Jinping, posam para foto após encontro de trabalho durante cúpula do G20, em Buenos Aires - Li Xueren/Xinhua

A abordagem explicitamente provocativa de Trump em relação a Pequim é bem recebida por muitos dos vizinhos da China. Japão, Coreia do Sul, Malásia e muitos outros países receiam que a crescente influência econômica chinesa esteja modificando o equilíbrio de poder regional de maneiras que os deixam vulneráveis. Eles têm bons motivos para esperar que Trump consiga forçar a China a abrir mais de seus mercados a produtos estrangeiros, reduzir os subsídios pagos a empresas chinesas e parar de impor a transferência –ou o roubo—da propriedade intelectual de firmas estrangeiras.

Mas é impossível para esses governos enxergarem Trump como um aliado confiável. Além do problema das tarifas americanas impostas às suas mercadorias, a decisão do presidente americano de abandonar o compromisso assumido pela administração anterior, do democrata Barack Obama, de entrar para a Parceria Trans-Pacífica –um enorme acordo comercial que avançou sem Washington—e suas declarações erráticas sobre política externa e comercial assinalam que eles fariam bem em proteger suas apostas em relação às intenções dos EUA. O fato de que as investigações sobre a campanha presidencial e a administração de Trump certamente vão se intensificar em 2019 não ajuda, como também não a incerteza sobre a posição da oposição democrata em relação ao comércio.

Nesse ambiente, a China vai seguir adiante com sua expansão ambiciosa, e embora sua estratégia de investimento, centrada em sua iniciativa Belt Road (a nova rota da seda), tenha implicações globais, o foco da atenção de Pequim permanece firme sobre a hegemonia chinesa na Ásia. Parte da finalidade da iniciativa é puxar as economias da região para mais perto da China, ao mesmo tempo em que reforça a influência estratégica de Pequim em cada país. Singapura, Indonésia, Malásia, Vietnã, Paquistão, Tailândia, Laos e Mianmar, todos receberam substanciais investimentos chineses nos últimos meses, e a guerra comercial EUA-China apenas intensificou a necessidade da China de desenvolver novos mercados para sua produção e novos produtores para fornecer as mercadorias que ela importa.

Os líderes chineses hoje têm plena consciência de que essa expansão está gerando uma reação de repúdio na Ásia e outras regiões, na medida em que políticos e empresas nos países vizinhos enxergam ameaças embutidas nos planos de Pequim. Este ano o primeiro-ministro da Malásia, Mohammed Mahathir, cancelou três projetos de investimento chineses em seu país e suspendeu um quarto, devido a receios de que deixariam seu país profundamente endividado. Os investimentos chineses também viraram fontes de discussão nas eleições na Tailândia e na Indonésia, onde uma forma de populismo islâmico alimenta a ira antichinesa.

No Paquistão vimos recentemente uma declaração muito mais dramática de ira contra a China. No mês passado, homens armados lançaram um ataque mortal ao consulado da China em Karachi. O ataque teria sido motivado pelos investimentos chineses em uma região do Paquistão reivindicada por separatistas. A China é uma investidora grande e crucial na economia paquistanesa, especialmente agora, quando a administração de Trump vem afrouxando os laços tradicionais dos EUA com o governo do Paquistão. Mesmo assim, cresce no país a preocupação com o que a China vai exigir quando o Paquistão, já endividado, não conseguir saldar a dívida com seus credores chineses. Poderíamos chamar isso de “diplomacia de armadilha de dívida” chinesa. É um problema sobre o qual mais governos vêm pensando ultimamente.

Mesmo nas Filipinas, onde o presidente Rodrigo Duterte tem buscado ativamente investimentos chineses em infraestrutura, há uma reação contrária ao alcance econômico crescente da China. Duterte abandonou as reivindicações territoriais de seu país no mar do Sul da China, uma área onde a expansão militar chinesa vem chamando a atenção internacional, e até agora recebeu pouco de concreto em troca. Com isso, seus rivais o estão acusando de trair os interesses do país. É uma questão que vai conturbar a política filipina muito depois de Duterte ter deixado o cenário político.

No entanto, apesar dos receios e dúvidas dos vizinhos da China, a influência duradoura desse país ainda constitui a realidade dominante na Ásia. Todos esses países precisam manter boas relações com Pequim –para que suas economias possam crescer, para que possam gerar empregos e conservar sua estabilidade política. Eles vão administrar os riscos e oportunidades de seus relacionamentos com a China da melhor maneira que puderem. O papel que os Estados Unidos pretendem exercer na Ásia permanece como a pergunta crucial não respondida.

Tradução de Clara Allain

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