Ian Bremmer

Fundador e presidente do Eurasia Group, consultoria de risco político dos EUA, e colunista da revista Time.

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Mundo terá anos difíceis pela frente com crise econômica e geopolítica

Com globalização ameaçada, mudança climática pode deixar tudo ainda pior

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Menos pessoas vivem na pobreza extrema hoje do que viviam em qualquer outro momento da história. As pessoas estão tendo vida mais longa do que nunca, são mais instruídas e têm acesso melhor à tecnologia. Segundo muitos critérios objetivos, a vida neste planeta nunca esteve melhor do que agora.

O problema é que não é essa a sensação que temos. E, em vista do que vem por aí, essa impressão tem suas razões de ser.

Ao longo de boa parte do século passado, a livre circulação internacional de pessoas, mercadorias, ideias e serviços –ou seja, a globalização— possibilitou eficiências de escala e avanços tecnológicos que ajudaram a melhorar a vida diária de bilhões de pessoas. Muitas pessoas que estão vivendo hoje nunca conheceram um mundo em que a globalização não fosse sinônimo da palavra “progresso”.

Mas não é mais assim. Como deixaram claro os últimos três anos de caos geopolítico e ascensão do populismo, muitos foram deixados para trás pela globalização –ou, pelo menos, sentem que foram, coisa que tem grande importância quando falamos em democracias. 

Esse tem sido o caso especialmente das classes médias e trabalhadoras dos países industrializados avançados, que enxergam a ascensão de uma nova classe média global na Ásia e América Latina como algo que ocorre à custa de seu próprio bem-estar. Pela primeira vez em quase um século o ímpeto por trás da globalização está começando a se enfraquecer.

E isso não poderia estar ocorrendo em um momento pior. O crescimento econômico global está perdendo força, e, após quase uma década de crescimento econômico ininterrupto que se seguiu à Grande Recessão, a economia global parece estar se encaminhando para uma retração.

Visto isoladamente, isso não seria motivo de preocupação especial: as economias tendem a descrever ciclos de sete ou oito anos de “boom and bust” (expansão e crise), crescendo e se retraindo segundo padrões relativamente bem previstos.

Ao longo do século passado, cada vez que o mundo se dirigiu para um período econômico difícil, o ímpeto da globalização foi afetado. Ele geralmente se recupera –mas não há garantia de que isso ocorra desta vez. Boa parte disso tem a ver com o fato de esta retração econômica particular estar sendo acompanhada por dois fenômenos novos.

O primeiro é a geopolítica atual. As pessoas tendem a falar que a economia se move em ciclos, mas o mesmo ocorre com a geopolítica. Só que os ciclos geopolíticos têm vida muito mais longa –eles se estendem em média por 70 a 80 anos.

Quando a geopolítica está na fase de “boom” do ciclo, os governos e as instituições internacionais estão bem coordenados e eficazes para resolver as questões globais; os conflitos internacionais diminuem e a cooperação econômica aumenta.

Quando a geopolítica está na fase de “bust”, a cooperação internacional diminui, acompanhada pela eficácia das instituições, e os conflitos globais crescem.

Não enfrentamos um ciclo de bust geopolítico real desde o final da Segunda Guerra Mundial, e isso ajuda a explicar por que tantas pessoas hoje estão assustadas, mesmo que não consigam necessariamente articular o porquê.

E há a mudança climática. Ela vem chegando há décadas, mas apenas recentemente começou a tornar-se uma questão política genuína, na medida em que os eventos climáticos extremos vêm aumentando de frequência e intensidade, pouco a pouco impelindo a questão das margens para o centro da preocupação política.

E ao mesmo tempo em que o aquecimento global vai ocupando o centro do palco, tornando-se uma das grandes questões existenciais de nosso tempo, os políticos terão menos espaço político e menos recursos para dedicar à questão, à medida que a globalização estaca e que tanto a economia quanto a geopolítica mergulham na fase descendente de seus respectivos ciclos.

Isso tudo significa que neste final de 2019 o mundo moderno se encontra em uma situação em que não esteve até hoje –globalização, geopolítica e economia todas entrando em fase negativa simultaneamente, ao mesmo tempo em que o ambiente físico do mundo se torna cada vez mais inóspito, exigindo uma ação conjunta e coordenada dos políticos do mundo em um momento em que não lhes faltam outras crises com as quais lidar.

Mas nem toda a esperança está perdida. As pessoas podem se consolar com o fato de que mais de 75 anos de globalização sólida tornaram o mundo mais rico e aumentaram seus conhecimentos, algo que sem dúvida ajudará sua resiliência em fazer frente às crises que vêm por aí.

As pessoas também podem se consolar com o fato de que a geopolítica e a economia se movem em ciclos e que em algum momento futuro vão voltar a ascender. Mas isso vai levar tempo, e enquanto isso, políticos, mercados e eleitores precisam preparar-se para alguns anos difíceis pela frente.

Tradução de Clara Allain

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