As faturas deixadas pela tormenta que se abate sobre essas terras desde os protestos de junho de 2013 gritam por pagamento, mas a resiliência da política brasileira é notável. Não falo em “velha política” porque tudo o que se vende por aí como “nova política” cheira a embuste e oportunismo, mas é a esse animal que me refiro.
A imolação de Joaquim Barbosa no altar do “novo da vez”, ocupando a vaga que já foi de Luciano Huck, João Doria e é disputada por um enxame de nanicos obscuros, é o mais recente sinal desse poder. Como vangloriou-se de forma envergonhada um estrategista do tucanato, do jeito que vai parece que Geraldo Alckmin levará por W.O.
Não iria tão longe, dada a cornucópia de sortilégios à frente do tucano. Mas há de fato um certo consenso na praça, intramuros porque agora é a hora em que todos são gatos e pardos na noite da pré-campanha, de que a corrida começa em agosto com alguns candidatos mais candidatos do que outros.
Pode ser, porque nunca se sabe se o novo não ressurgirá como surpresa ou declaração retificadora. Isso posto, não deixa de ser irônico que o maior desafio da (velha) política, noves fora o efeito Lava Jato e o condomínio abstenção/nulo/branco, possa vir a ser um adversário tão velho quanto o Tinhoso: a economia.
Inicialmente, o governismo via chance de uma recuperação gloriosa após os anos finais de desastre do petismo. Estabilizou o paciente, ensaiou uns passos, mas desde que o dono do hospital recebeu um açougueiro para conversas indevidas à noite o médico perdeu condições objetivas de levar o tratamento à frente.
Não que Henrique Meirelles tivesse um futuro brilhante como candidato. Ou Temer, Maia, Paulo Rabello (Quem? Pois é). Mas o enguiço registrado na melhora econômica, somado à incerteza que a implosão do projeto Mauricio Macri na Argentina gera, levanta sobrancelhas sobre qual a melhor forma de lidar com a questão em outubro.
Para a esquerda, com Ciro Gomes e provavelmente algum poste de Lula, é fácil: pau puro, crítica à desgraceira nacional —como se ela nada tivesse a ver com o que o mesmo campo dito progressista fez com as contas públicas. Para a direita, aqui representada pela anticandidatura Bolsonaro, é o mesmo com alguns sinais trocados. Marina Silva, bom, para ela pode ser isso, aquilo ou nada, tudo depende, sabe como é.
Já a centro-direita que Alckmin parece estar fadado a herdar, se a política seguir seu curso atual, poderá dizer que apoiava a reconstrução da economia (não tem como falar o contrário, o PSDB foi governo), mas que foi contra a lambança política que ajudou a travar um processo que chegou a dar bons frutos (inflação, juros). Por outro lado, seus próprios rolos éticos e a sombra crescente de Paulo Preto carregam o veneno para esse antídoto.
Sob essa ótica, a aproximação que Alckmin ensaiou com o MDB de Temer, de resto mais incentivada pelo Planalto do que pelo tucano, é incompreensível mesmo que o medo de Barbosa fosse real. Claro, boas maneiras são desejáveis e palanques estaduais, mais ainda. Mas quanto mais tempo o ex-governador passa flertando com o espectro que habita o Planalto, mais difícil será dizer que não é parte integral da assombração.
O cenário é favorável à política? Claro que não. Seja quem for, o próximo presidente enfrentará um buraco fiscal que demandaria força eleitoral e um Congresso cooperativo. A segunda parte é fácil, com o preço que conhecemos, mas a primeira, não. E o mandatário fraco terá de lidar com o carrossel de escândalos que parece estar à espreita no caso da delação dos doleiros. É um coquetel infernal.
Assim, as faturas acumuladas desde 2013 tendem não só a aumentar, mas talvez a chegar a um paroxismo.
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