Igor Gielow

Repórter especial, foi diretor da Sucursal de Brasília da Folha. É autor de “Ariana”.

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Na briga EUA-China pelo 5G, Brasil precisa olhar para seu interesse

É preciso desconfiar tanto de Pequim quanto de Washington quando o assunto é espionagem

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A guerra mundial tecnológica em curso entre Estados Unidos e China aportou no Brasil na forma de lobbies diretos sobre a adoção do 5G.

Eduardo Bolsonaro cumprimenta Trump durante visita à Casa Branca em agosto
Joyce N. Boghosian - 30.ago.2019/Casa Branca

Como é decantado, o 5G usa frequências por onde transitam a internet das coisas, a integração que vai da sua geladeira a drones assassinos, por aí vai. O futuro do consumo na área da mobilidade digital, com velocidade e confiabilidade incomparáveis aos padrões atuais, moldando todo o ramo de negócios virtuais.

Longe dos delírios expostos no documento produzido a partir de consultas da Escola Superior de Guerra sobre ameaças futuras ao Brasil, que provocou chacota na nossa “grande inimiga” França após a Folha o revelar, este combate é tangível e que já causa fissuras no governo Bolsonaro.

De um lado, a família do presidente e seu vocal defensor de interesses americanos e israelenses no mundo do poder, o deputado Eduardo Bolsonaro (SP). Em entrevista ao jornal O Globo nesta terça (11), ele demonstrou ter comprado a ideia básica de Washington: o uso de equipamentos de origem chinesa trará riscos a eventuais parcerias militares com o Grande Irmão do Norte.

A seu lado está, por ora ao menos, tendendo o GSI (Gabinete de Segurança Institucional) capitaneado pelo general Augusto Heleno. Pelos relatos disponíveis em Brasília, o antigo conselheiro de Bolsonaro, ora em baixa em debates internos no governo, simpatiza com a argumentação americana acerca dos riscos chineses.

Há questões importantes embutidas, como ensinam as crônicas infernais, nos detalhes. A principal empresa chinesa de 5G é a Huawei, amplamente usada no 4G brasileiro. Para os EUA, usar uma rede dela significa abrir seus segredos para Pequim.

Ainda que ela não seja uma estatal, como erroneamente disse Eduardo, é óbvio que a preocupação procede. Tanto foi assim que diversos governos pressionados pela Casa Branca de Donald Trump pediram evidências de como tal risco ocorreria —a começar pelo principal parceiro militar dos EUA, o Reino Unido.

Há duas semanas, contudo, Londres fez sua análise da situação achou uma saída salomônica e que, na teoria, incentiva a competição: a Huawei poderia fornecer equipamentos para as redes britânicas de 5G, assim como fabricantes americanos e europeus. Mas estaria fora de instalações sensíveis, como as militares e as nucleares.

Isso talvez pudesse resolver a questão por aqui, salvaguardando interesses —não só americanos, mas brasileiros. Tal leitura mais técnica tem apoio entre servidores da área de ciência e tecnologia do governo, que estão trabalhando no edital publicado para o leilão das frequências de 5G.

Setores não alinhados com o bolsonarismo nas Forças Armadas têm demonstrado preocupação com esse afã do governo em topar qualquer negócio com os EUA só porque é com os EUA.

Não menos do que um general lembrou que o maior escândalo de espionagem de autoridades brasileiras na história não foi patrocinado nem por Xi Jinping, nem por Vladimir Putin, e sim pelo boa-praça Barack Obama. Alguém vai dizer que ele era comunista, mas enfim.

Ter virado parceiro preferencial fora da Otan (aliança militar ocidental) dos EUA é um prêmio potencial para o Brasil, mas a ênfase no “potencial” é necessária.

Se integrarmos a cadeia do maior mercado militar do mundo, será excelente para empresas nacionais. Mas esquecer do histórico da Agência de Segurança Nacional na arapongagem contra brasileiros só porque eles eram petistas, ou ignorar as relações de agências de inteligência americanas com grandes empresas de tecnologia daquele país, não parece configurar o melhor da defesa do interesse nacional.

Como o Brasil já está atrasado no debate do 5G, e convenhamos que o 4G funciona porcamente Brasil afora, cabe usar o tempo para uma análise mais detalhada do que está na mesa.
 

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