Ilona Szabó de Carvalho

Presidente do Instituto Igarapé, membro do Conselho de Alto Nível sobre Multilateralismo Eficaz, do Secretário-Geral. da ONU, e mestre em estudos internacionais pela Universidade de Uppsala (Suécia)

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Ilona Szabó de Carvalho

Polícia, governo, milícia e motins

Greves policiais, embora proibidas, não são incomuns no Brasil

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Nas últimas semanas, assistimos ao acirramento das tensões entre polícias militares e governadores em diversos estados do país. O motim da polícia do Ceará foi o caso mais emblemático.

De um lado PMs mascarados —sem identificação e com armas do estado— fazendo refém e aterrorizando uma cidade. E do outro um senador licenciado em uma retroescavadeira tentando furar o bloqueio dos policiais e sendo atingido por tiros. 

O abuso de poder público de polícia e político no país vem crescendo de forma alarmante com o atual governo. 

O presidente da República, enquanto militar e parlamentar, participou, insuflou e apoiou motins militares e policiais. Se havia dúvidas sobre sua postura com as novas responsabilidades e o decoro do cargo que hoje ocupa, já temos as respostas. 

O presidente não somente tem os membros das forças de segurança pública do país entre seus principais apoiadores, como ajudou a eleger vários deles.

O número de policiais e militares eleitos para o legislativo quadruplicou na eleição de 2018, em comparação com a de 2014, somando 72 representantes em assembleias estaduais e no Congresso Nacional.

Greves policiais, embora proibidas, não são incomuns no Brasil. Entre 1997 e 2017 houve 52 greves da polícia militar, de acordo com um estudo de José Vicente Tavares dos Santos, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

A questão é que reivindicações legítimas das forças policiais têm sido cada vez mais usadas por associações politizadas ou representantes eleitos (até recentemente, principalmente no Poder Legislativo) para apoiar ou desafiar o poder político. 

Verdade seja dita, governadores e presidentes, historicamente, não abordaram as questões estruturais necessárias para se ter forças policiais profissionais no Brasil.

Corporações policiais e suas famílias têm sido usadas como importantes forças eleitorais, e, por isso, a maioria dos políticos eleitos evita lidar com questões chave para a melhoria da segurança pública e para a modernização das corporações policiais.

Neste sentido, a eleição de Bolsonaro é, em parte, um produto da leniência e da negligência de décadas com a segurança pública e as forças policiais, e não a causa das tensões atuais.

Mas o momento é extremamente perigoso. A luta de policiais por melhores salários e condições de trabalho é legítima e merece atenção, uma vez que a categoria enfrenta uma série de desafios.

No entanto, o uso de violência como instrumento de negociação por parte dos agentes contra a população e os governadores, e o apoio do presidente e seus aliados da bancada da bala é inaceitável. Ambos desvios precisam ter consequência. 

Há claros indícios de que a politização das polícias e o incentivo para que partes dessas forças atuem como milícias, desestabilizando governos locais e apoiando o governo central, fazem parte de um plano maior de minar as bases da República e da convivência democrática.

A militarização do governo e a política de armar até os dentes os civis que são leais apoiadores do governo, como é o caso dos colecionadores, atiradores e caçadores, parecem se encaixar na mesma estratégia.  

Governadores precisam se unir e enfrentar questões de fundo para democratizar e profissionalizar  suas forças policiais. De um lado precisam oferecer melhores condições de trabalho, com aprimoramento dos planos de carreiras, formação e cuidados de saúde mental. 

Ao mesmo tempo precisam instituir controle civil sobre as polícias com especial atenção para o uso proporcional e legítimo da força. Se assim o fizerem estarão dando grande contribuição para a consolidação democrática no país. A alternativa é a barbárie.

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