Ilona Szabó de Carvalho

Presidente do Instituto Igarapé, membro do Conselho de Alto Nível sobre Multilateralismo Eficaz, do Secretário-Geral. da ONU, e mestre em estudos internacionais pela Universidade de Uppsala (Suécia)

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Ilona Szabó de Carvalho
Descrição de chapéu Fies Enem

Escolas no alvo da violência extrema

É na escola que adquirimos as ferramentas para moldar a sociedade

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No último dia 27, uma escola em São Paulo foi palco de mais um atentado violento, desta vez envolvendo um aluno de 13 anos. O ataque a facadas que vitimou uma professora e deixou outras cinco pessoas feridas se soma a outros casos cada vez mais frequentes de violência extrema no ambiente escolar brasileiro. Estudo da Universidade Estadual de Campinas revelou que, nas últimas duas décadas, o Brasil registrou 23 ataques em escolas, sendo sete deles apenas no segundo semestre de 2022 e três em 2023.

Há uma soma de fatores que tornam tais tragédias cada vez mais comuns. Elas são sintoma de um sistema social e político em crise. Entre os fatores chave, a violência que ocorre dentro dos muros das escolas retrata um fenômeno mais amplo de radicalização que não está próximo de ser solucionado. Nos últimos anos, a ampliação do extremismo no campo político e ideológico deu voz a discursos cada vez mais inflamados e radicais. Alimentadas por narrativas de desinformação, redes cada vez mais violentas passaram a atacar os direitos humanos, a ciência e a própria democracia no Brasil.

A juventude, por sua vez, amplamente conectada ao ambiente virtual, não sai ilesa da batalha ideológica travada na internet. A incitação a atos violentos e a disseminação de discursos de ódio nas redes sociais têm impulsionado cada vez mais episódios de apologia ao nazismo e ofensas misóginas e racistas nas escolas. Plataformas como o Discord e o Telegram são meios profícuos de recrutamento de jovens. Vale notar que o autor do ataque da última semana vestia uma máscara com estampa de caveira, marca registrada de um grupo neonazista americano, utilizada em outros dois atentados recentes, nas escolas em Aracruz (ES) e Suzano (SP). Isso não é mera coincidência.

Tais ataques se inserem, ainda, em um cenário de ampla flexibilização e defesa do acesso a armas pela população. Atrás desse incentivo ao armamento civil, há uma mensagem velada que reconhece o uso da violência como forma legítima de resolução dos conflitos. Não surpreende, portanto, que o estudante que realizou o atentado compartilhasse mensagens e vídeos portando armas e simulando ataques violentos em suas redes sociais. Ele inclusive estava planejando fazer o atentado com uma arma de fogo, mas não conseguiu.

Mas se, por um lado, as escolas refletem em certa medida as normas, os valores e as crenças da sociedade mais ampla, elas também são espaços de questionamento e construção de novas realidades. Não à toa, em regimes autoritários a educação é uma das áreas mais afetadas. A produção do pensamento crítico representa uma ameaça perigosa, pois é a principal matéria-prima da mudança.

Na última gestão, uma série de livros didáticos foi retirada de editais escolares, suprimindo temas como o compromisso com a agenda da não violência contra as mulheres e a promoção das culturas quilombolas e dos povos do campo. Professores relataram ingerências em áreas de estudo como sexualidade, direitos humanos e meio ambiente. Mais recentemente, pais pediram a retirada da obra de Djamila Ribeiro "Pequeno Manual Antirracista" da grade de um colégio em Niterói (RJ).

A escalada do ultraconservadorismo e da extrema direita no Brasil nos coloca diante de um cenário pouco animador, de crescentes ameaças nas escolas e às escolas, defesa do uso de armas, incitação da violência e censura ao debate crítico. Por outro lado, temos a oportunidade de mudar os rumos se encararmos a educação e, portanto, as escolas como espaços capazes de colocar nosso país em trilhos mais democráticos. E para isso a prática do diálogo, o espaço para o contraditório e o compartilhamento de ferramentas de resolução de conflitos são essenciais.

Se é na escola que aprendemos a conviver em sociedade, é nela também que, em grande parte, adquirimos as ferramentas para moldá-la.

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