Ivan Marsiglia

Jornalista e bacharel em ciências sociais, Ivan Marsiglia é autor de “A Poeira dos Outros”.

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Lula solto, Evo amarrado

Twitter reflete o complicado xadrez geopolítico da América do Sul

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As peças espalhadas no tabuleiro político sul-americano, envolvendo Brasil e Bolívia, que sugerem um jogo ainda indeterminado – e às vezes sujo – pela hegemonia do continente, expressaram-se com nitidez nas bolhas conservadora e progressista do Twitter.

A libertação, na sexta-feira (8), do “maior ídolo da esquerda globalista do mundo”, nos dizeres do ex-estrategista-chefe do governo Trump, Steve Bannon, repercutiu fortemente na plataforma com 775 mil menções à palavra “Lula”.

@bbcbrasil Em entrevista exclusiva ao repórter @ricksenra, Bannon fala pela primeira vez sobre a libertação de Lula, a quem classifica como "rockstar internacional da esquerda globalista". Para o ex-estrategista chefe de Trump, petista é "cínico e corrupto e trará corrução de volta”.

Na reportagem, que traz uma foto de Bannon ao lado do ex-futuro embaixador brasileiro em Washington, Eduardo Bolsonaro, o norte-americano diz que as investigações sobre os laranjas no PSL são “puro non sense” e uma tentativa de desestabilizar o governo de extrema-direita brasileiro. “Aconteceu o mesmo com Trump”, afirma.

Na sexta-feira (8), o vice-presidente lamentou a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que considerou inconstitucional a prisão depois da segunda instância e permitiu a saída do ex-presidente da carceragem da Polícia Federal em Curitiba, 580 dias após sua prisão pelo então juiz e hoje ministro da Justiça, Sergio Moro:

@GeneralMourao “O Estado de Direito é um dos pilares de nossa civilização, assegurando que a Lei seja aplicada igualmente a todos. Mas, hoje, dia 8 de novembro de 2019, cabe perguntar: onde está o Estado de Direito no Brasil? Ao sabor da política?”

A deputada federal pelo PT-PE e neta do ex-governador Miguel Arraes, exilado durante a ditadura militar, comemorou no sábado (9): @MariliaArraes “Lula deixou o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC nos braços do povo, o mesmo povo que sabe de sua importância para o país. Lula já havia entrado para a história e escreveu hoje um novo capítulo dessa história. Lula está livre para ajudar a libertar o Brasil”.

No mesmo dia, outro general do núcleo governista, o chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), protestava no Twitter: @gen_heleno “Lula, em seu discurso, mostra quem é e o que deseja para o país. Incita a violência (cita povo do Chile como exemplo), agride várias instituições, ofende o Pres Rep e mostra seu total desconhecimento sobre carreira militar”.

O ex-candidato a vice-presidência na chapa de Marina Silva e ex-secretário municipal na administração José Serra foi direto: @EduardoJorge “O STF votou está votado. A Constituição deve ser respeitada por todos nós”.

Um perfil dedicado às ideias do guru do bolsonarismo expressou sua discordância – em tom de incitamento que não passou despercebido a um colunista da revista Veja: @opropriolavo “A pergunta da semana: ‘Quem encher um ministro do STF de porrada na rua só vai ser preso em última instância?’” @BlogdoNoblat “Isso não é uma pergunta, é uma sugestão do guru da família Bolsonaro. Está na cara.”

O inconformismo da bolha governista em relação ao STF cristalizou-se na hashtag #ImpeachmentGilmarMendes, que, na tarde de segunda-feira (11), batia em 165 mil tuítes.

Entre vozes à direita, mas também à esquerda, que expressaram temor de que Lula livre nas ruas acirre a polarização no país, coube ao escritor @michellaub, autor de "Diário da Queda", rejeitar a afirmativa: “Polarização política era o que havia antes de um dos lados ser pró-tortura e contra educação/minorias/ciência etc. A partir daí virou civilização x barbárie. Não há nada no pacote da esquerda, incluindo acertos e erros, que esteja num nível remoto de comparação com o bolsonarismo.”

Veias abertas 

A ruptura institucional na Bolívia foi o segundo assunto mais comentado no Twitter nos últimos dias: pouco antes das 22h de domingo (10), data em que o presidente reeleito Evo Morales apresentou sua renúncia sob pressão da oposição, do Exército e de forças policiais, a expressão “Golpe de Estado” aparecia em 619 mil tuítes.

No mesmo horário, o presidente deposto foi à plataforma protestar: @evoespueblo “Denuncio ao mundo e ao povo boliviano que um oficial de polícia anunciou publicamente ter sido instruído a executar um mandado de prisão ilegal contra minha pessoa; da mesma forma, grupos violentos assaltaram minha casa. Os golpistas destroem o Estado de Direito.”

Em tuíte posteriormente apagado, mas printado por usuários da plataforma, a procuradora @MoniqueCheker chegou a comemorar a tomada do poder pelos militares em La Paz: @redecastorphoto “Monique Cheker escreveu em seu Twitter um post em apoio ao golpe de Estado na Bolívia. Procuradora da Lava Jato comemora golpe na Bolívia e desmoraliza o MP.”

Após a repercussão negativa, tuitou uma ressalva: @MoniqueCheker “Boa notícia só se for seguida de eleições democráticas.”

Outro que deletou sua manifestação imediata sobre a queda do presidente boliviano foi o apresentador e pré-candidato à Presidência @LucianoHuck. Seu primeiro tuíte dizia que “a renúncia de Evo Morales é uma chance única p/ renovar a democracia Boliviana. Errou ao tentar se perpetuar no poder. Errou ao não permitir uma saudável alternância no cargo, culminando num pleito fraudado segundo a OEA. Agora é juntar os cacos e cuidar para que não haja rupturas.”

O “erramos” viria na sequência, diante das notícias crescentemente negativas sobre o desenrolar dos acontecimentos no país: @LucianoHuck “Espero que a Bolívia restabeleça a sua democracia; eleições livres, e livres de fraudes. O Estado Democrático de Direito deve ser respeitado. Repudio todas as manifestações q vão contra a democracia, daqueles que fraudam eleições ou dos que usam da força p/ depor um presidente.”

A entrada em cena do presidente russo Vladimir Putin provocou outra onda de manifestações no Twitter: no início da tarde de segunda (11), os trending topics registravam 94,2 mil menções ao nome “Putin”.

O cientista político argentino Juan Manuel Karg, especializado em América Latina e Caribe, repercutiu a dura nota emitida pela chancelaria russa: @jmkarg “Ministério das Relações Exteriores da Rússia na Bolívia: ‘É profundamente preocupante que o desenvolvimento de eventos, seguindo as diretrizes de um golpe de Estado orquestrado, estrague a disposição do governo de buscar soluções construtivas e dialogadas durante a crise política’”.

A nota, que sugere a interferência de forças internacionais na Bolívia, pôs o governo brasileiro na berlinda –fato também registrado pelo professor de relações internacionais da UFMG, @dbelemlopes “Passou quase batido um vídeo de Camacho, líder de oposição, aliado de Mesa, em frente ao Palácio do Itamaraty, chamando o Brasil de ‘país garante da Constituição da Bolívia’ e alegando ter recebido instruções de Ernesto Araújo. Uma pérola do sub-imperialismo. Pobres bolivianos.”

O chanceler brasileiro posicionou-se: @ernestofaraujo “Não há nenhum golpe na Bolívia. A tentativa de fraude eleitoral maciça deslegitimou Evo Morales, que teve a atitude correta de renunciar diante do clamor popular. Brasil apoiará transição democrática e constitucional. Narrativa de golpe só serve para incitar violência.”

Lá como cá 

Do jornalista @torturra, do Estúdio Fluxo, que documenta a ascensão do bolsonarismo desde a campanha presidencial de 2018: “A radicalização e autonomia ideológica das polícias é um dos processos políticos mais importantes e menos observados no mundo. O golpe boliviano é um alerta enorme para o Brasil. Que além do presidente miliciano tem na PM uma instituição estatal CULTUADA por boa parte do povo”.

Cabeça a prêmio 

A agressão do jornalista Augusto Nunes ao colega Glenn Greenwald, convidado do programa Pânico, da Jovem Pan, na quinta-feira (7), provocou manifestações de repúdio e também aplausos no Twitter.

O deputado federal pelo PT-SP, @pauloteixeira13, foi ferino: “A agressão à Glenn Greenwald é o mais próximo que Augusto Nunes vai chegar de um Pulitzer”.

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