Ivan Marsiglia

Jornalista e bacharel em ciências sociais, Ivan Marsiglia é autor de “A Poeira dos Outros”.

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Noivado de atriz com homem santo é segundo ato de ópera bufa na Cultura

Escolhida por Bolsonaro, Regina Duarte escala os TTs do Twitter

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Às 18h desta segunda-feira (20), poucas horas depois do tuíte de Jair Bolsonaro anunciando seu namoro com a “namoradinha do Brasil” para o lugar de Roberto Alvim na Secretaria Especial da Cultura, 33,8 mil menções a “Regina Duarte” figuravam nos Trending Topics do Twitter.

O presidente Jair Bolsonaro ao lado da atriz Regina Duarte e do ministro-chefe da secretaria de governo Luiz Eduardo Ramos

Na mensagem, o presidente tomou o cuidado de não cravar casamento: @jairbolsonaro “Tivemos uma excelente conversa sobre o futuro da cultura no Brasil. Iniciamos um ‘noivado’ que possivelmente trará frutos ao país.”

O ex-chefe de gabinete do presidente Fernando Henrique Cardoso, convertido ao bolsonarismo, aplaudiu: @xicograziano “Falem o que quiser, foi um golaço de @jairbolsonaro. Regina Duarte é querida, séria, capaz, articulada. Sempre apoiou o PSDB contra o PT, mas nunca foi partidária. Dá um exemplo: precisamos nos engajar para consertar o Brasil.”

A caminho do encontro com o presidente, Regina usara sua conta no Instagram para proclamar: “O feriado de hoje no Rio é dedicado a São Sebastião. Nada acontece por acaso. Olha só, querido seguidor, que dia importante para ter sido chamada ao Rio para uma conversa ‘olho no olho’ do nosso Presidente da República. Olha quanta simbologia contém a vida deste homem santo.”

Na ilustração da postagem, no entanto, enganou-se de santo, o que não passou despercebido a usuários como o jornalista e coordenador do coletivo #ResistaSP, @delucca “A Regina Duarte começou bem na secretaria de cultura do governo Bolsonaro: fez post sobre São Sebastião e postou foto de Santo Expedito, desagradando simultaneamente evangélicos e católicos.”

A atuação da atriz também desagradou a antropóloga, professora da UnB e colunista do El País, @Debora_D_Diniz “Regina Duarte se move como as mocinhas puritanas do passado. Aceitou o noivado. Viverá um ‘teste’ como secretária de Cultura. A vida real não aceita testes. A política não é uma novela de ocinhas nem para puritanas protegidas pelo homem santo.”

E a colunista de TV @Padig lembrou a manifestação da atriz sobre a censura ao especial de Natal do Porta dos Fundos, considerada inconstitucional e derrubada pelo Supremo Tribunal Federal no dia 12 de janeiro: “Logo após STF derrubar censura, Regina Duarte compartilhou vídeo de Vereza alertando sobre a ‘lei do retorno’ envolvendo Jesus, Maria e Porta dos Fundos.”

Trilha nada casual 

Na sexta-feira (17), quando a ópera bufa na Secretaria Especial da Cultura ainda exibia contornos trágicos, o vídeo do diretor teatral Roberto Alvim —ao som do prelúdio de Lohengrin, de Richard Wagner, a ópera predileta de Adolf Hitler— gerou repúdio no Twitter tanto por parte de instituições judaicas quanto alemãs.

Às 10h14, a Confederação Israelita do Brasil tuitou: @coniboficial “Conib condena fala de secretário da Cultura e pede seu afastamento imediato.”

 

Às 10h54, a conta da embaixada da Alemanha no Brasil postou: @Alemanha_BR “O período do nacional-socialismo é o capítulo mais sombrio da história alemã, trouxe sofrimento infinito à humanidade. A Alemanha mantém sua responsabilidade. Opomo-nos a qualquer tentativa de banalizar ou mesmo glorificar a era do nacional-socialismo.”

Antes mesmo, às 9h16, o presidente da Câmara dos Deputados já pedira a exoneração de Alvim pelo Twitter: @RodrigoMaia “O secretário da Cultura passou de todos os limites. É inaceitável. O governo brasileiro deveria afastá-lo do cargo.”

E o apresentador e pré-candidato à Presidência da República @LucianoHuck recorreu à sua ascendência para protestar: “Sou brasileiro de família judia. 6 milhões de judeus morreram por causa do nazismo. O holocausto é um fato histórico. Usar a Cultura para fazer revisionismo histórico é perverso e violento. Revela uma conduta autoritária inaceitável.”

Furo independente 

Sinal dos tempos dessa era digital, a divulgação da citação literal do ministro da propaganda nazista Joseph Goebbels no vídeo de Alvim coube a um site independente de jornalismo, a partir de uma informação tuitada pela advogada especialista em negociações coletivas e litígios Manuela Lourenção: @J_LIVRES “EXCLUSIVO: Secretário da cultura de Bolsonaro copia Goebbels em discurso.”

O tuíte da advogada fora publicado na véspera, 16 de janeiro, às 11h07 da noite: @manueca “Olha o cara plagiando Goebbels ‘A arte alemã da próxima década será heroica, será ferreamente romântica, será objetiva e livre de sentimentalismo, será nacional com grande pathos e igualmente imperativa e vinculante – ou então não será nada.’”

Logo depois de demitir o secretário, o presidente deu pistas de onde o calo apertou: @jairbolsonaro “Reitero nosso repúdio às ideologias totalitárias e genocidas, como o nazismo e o comunismo, bem como qualquer tipo de ilação às mesmas. Manifestamos também nosso total e irrestrito apoio à comunidade judaica, da qual somos amigos e compartilhamos muitos valores em comum.”

E um tuíte do ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, @gen_heleno, intrigou usuários da plataforma pelo tom supostamente irônico: “Fantástica, e até emocionante, a reação de intelectuais, artistas, historiadores, professores, estudantes, militares e da nação como um todo, ao infeliz resgate de pensamentos nazistas. Mostra uma face da convicção e do apego de nosso povo à democracia e às liberdades individuais.”

Brasil acima de tudo 

Após a reação inicial por parte da bolha governista acusando “funcionários lulo-petistas” de terem incluído o trecho no discurso escrito por Alvim, o jornalista @allantercalivre se disse perplexo: “Há uma coisa intrigante no ar: - Alvim não foi sabotado; - Ninguém próximo dele entendeu que merda foi aquela; - Os opositores querem emplacar a narrativa de que o governo pensa assim; - Tá tudo muito estranho.”

Tempos estranhos que outra jornalista, comentarista do programa Saia Justa na GNT, preferiu projetar para o futuro: @barbaragancia “Se Goebbels fez o estrago que fez na época da caneta tinteiro e do telégrafo, imagina o que uma Cambridge Analytica não pode fazer na era digital com algoritmo, pesquisa de mercado, psicologia social e rede social. E os bucéfalos achando que o inimigo é a imprensa...”

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