Jaime Spitzcovsky

Jornalista, foi correspondente da Folha em Moscou e Pequim.

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Partidos, smartphones e a Telesp

Legendas tradicionais, imobilistas, lembram os aparelhos telefônicos antigos

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O líder da CSU, Horst Seehofer, durante entrevista coletiva para falar das negociações para formar governo no estado alemão da Baviera - Christof Stache - 17.out.18/AFP

As urnas, em diversos rincões do planeta, seguem golpeando partidos tradicionais, em intenso alarido sobre o crescente fosso entre estruturas políticas estagnadas e sociedades civis em transformações frenéticas. Recente eleição na Baviera levou a CSU, de centro-direita, a engrossar uma lista de recordes negativos, ao amealhar 37,2% dos votos, seu pior resultado desde 1950.

A CSU corresponde à versão bávara da CDU, partido de Angela Merkel. Em aliança, capitaneiam o campo ideológico outrora de figuras como Konrad Adenauer (1876-1967), pai da recuperação pós-guerra, e Helmut Kohl (1930-2017), mago da reunificação.

Na eleição nacional de 2017, Merkel amargou o pior placar da CDU desde 1949, com 26,8%. Adenauer, em 1950, chegou a 39,7%, enquanto Kohl, em 1983, recolheu 38,1%. Apesar de enfraquecida com as críticas à política para refugiados e à opção de canalizar recursos para países europeus em penúria, Merkel ainda se reelegeu e montou coalizão com um adversário tradicional, o SPD, de centro-esquerda.

A social-democracia alemã, na última votação nacional, experimentou o vexame. Também registrou marca histórica, a menor desde 1949: 20,5%. Em 1972, na Guerra Fria, chegou ao patamar de 45,8%, sob a liderança de Willy Brandt (1913-1992), mentor da aproximação com a Alemanha Oriental (Ostpolitik).

Na Suécia, considerada por décadas a vitrine social-democrata, o partido de centro-esquerda registrou, em setembro, a mais magra votação desde 1911. Ficou com 28,3%, embora ainda dono da maior bancada no Parlamento.

A maior debacle, entre correntes europeias tradicionais, talvez tenha sido colhida pelos socialistas franceses. Com o candidato Benoît Hamon, o PS contabilizou, no primeiro turno da eleição presidencial de 2017, 6,36%, queda assombrosa em relação aos 43% de François Mitterrand, em 1974.

Ignorando opções ideológicas, o tsunami a derreter atores políticos clássicos atingiu também os conservadores franceses. Seu candidato, François Fillon, não chegou ao segundo turno e teve de acompanhar o embate entre o centrista Emmanuel Macron e Marine Le Pen, de extrema direita.

A eleição italiana, em março, empurrou para a derrota o Partido Democrático, de centro-esquerda, e os direitistas do Forza Italia, enquanto o novato e antissistema Movimento Cinco Estrelas liderou a votação, para montar governo com a Liga Norte, de extrema direita.

Resultados eleitorais em outras paragens da Europas, como Holanda e Espanha, contribuem para escancarar o enferrujamento de antigas engrenagens políticas. 

A abissal falta de sintonia entre pilares da política tradicional e anseios da sociedade civil pavimenta espaços para populismos de matizes diversos, à esquerda e à direita.

Na Baviera, duas semanas atrás, a CSU testemunhou avanço eleitoral do Eleitores Livres, organização a rejeitar pilares da política tradicional, e do Alternativa para a Alemanha (extrema direita), que, com 10% dos votos, contará pela primeira vez com representantes no Parlamento regional.

Para usar a analogia do telefone: no século 21, sociedades em diversos pontos do planeta, com impactos de revoluções tecnológicas, de mudanças de costumes e de crises sociais e econômicas, se assemelham a smartphones, por suas rápidas mutações. Partidos políticos tradicionais, imobilistas e com ares jurássicos, lembram os aparelhos cinzentos dos tempos da Telesp. Para o bem da democracia, urge diminuir o abismo entre algumas estruturas partidárias e os anseios e expectativas de eleitores.

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