Jaime Spitzcovsky

Jornalista, foi correspondente da Folha em Moscou e Pequim.

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Descrição de chapéu China

China redesenha a diplomacia do Oriente Médio

Com cálculo econômico, Pequim ignora disputas históricas da região e faz amplo arco de alianças

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A China, em esforços para alimentar a decolagem econômica e expandir influência global, inova em capítulos recentes do conflagrado script geopolítico do Oriente Médio ao, mais uma vez, aplicar doses cavalares de pragmatismo na política externa. De olho no fornecimento de petróleo e em destinos para seus investimentos, o governo chinês ignora acrobaticamente rivalidades da região, evita escolher lados em disputas históricas e monta amplo arco de alianças, para alcançar objetivos estratégicos e escapar das armadilhas médio-orientais.

Desponta como ilustração fulgurante da abordagem chinesa o conflito a opor o regime teocrático do Irã a seus inimigos regionais, Israel e Arábia Saudita, aliados dos EUA. A lógica maniqueísta da Guerra Fria, transplantada aos dias de hoje, sugeriria alinhamento automático de Pequim a Teerã, mas o dirigente Xi Jinping, seguindo uma bússola do século 21, costura laços com todos os personagens relevantes do tabuleiro local.

Xi Jinping, ao centro, durante a quarta sessão da 13ª Assembleia Popular Nacional da China. - Li Xueren/Xinhua

No ano passado, China e Irã implementaram passos de aproximação nos campos econômico, político e militar. Lentes habituadas ao mundo bipolar se apressaram a colar em Pequim um rumo inevitável de antagonismo com Israel e Arábia Saudita.

A política externa chinesa, no entanto, ignora a armadilha e implementa uma aproximação de momento com o Irã, mas sem se desviar de um roteiro determinado por interesses estratégicos, responsáveis por uma visão holística do Oriente Médio.

Maior importador mundial de petróleo, a China busca fornecedores sem considerar sua vertente política ou religiosa. A segunda maior economia do planeta também guarda interesse estratégico na manutenção de rotas marítimas, como as do Golfo Pérsico, sem turbulências ou bloqueios a estrangular comércio internacional e o fluxo petrolífero.

Xi Jinping, em 2013, anunciou um pilar central de sua política externa, a Iniciativa Cinturão e Rota (BRI, na sigla em inglês). A estratégia, apoiada na abundância de capital chinês, consiste em sair pelo mundo investindo sobretudo em infraestrutura, como portos, aeroportos e ferrovias.

Na cartografia do BRI, o Oriente Médio apresenta cores de destacada e histórica relevância geográfica, como ponte para o comércio chinês com a Europa, fluxo já verificado séculos atrás com a famosa Rota da Seda. Pequim ganha peso regional ao investir em portos de Israel, em arranha-céus no Egito, em petroquímica na Arábia Saudita e em telecomunicações no Irã.

No início de 2016, seis meses após a assinatura do polêmico acordo nuclear das potências globais com o regime iraniano, Xi Jinping desembarcou no Oriente Médio para reafirmar suas opções. O tour começou na Arábia Saudita e terminou no Irã, em clara demonstração da tática de pairar sobre rivalidades regionais.

O presidente da China, Xi Jinping, na província de Guizhou em evento para o Ano-Novo chinês. - Xie Huanchi/Xinhua

A aproximação recente entre Pequim e Teerã serviu a necessidades de curto prazo. Ao enfrentar a política de “pressão máxima”, diplomática e econômica, imposta pela administração Trump, os iranianos desejaram sinalizar uma válvula de escape, representada pela China.

Já o gigante asiático também usou o flerte maior com o Irã para evidenciar a israelenses e sauditas desagrado com seus apoios a medidas contrárias à China. implementadas pela política externa trumpista, empenhada em isolar Pequim.

O Oriente Médio, habituado recentemente a uma lógica bipolar típica da Guerra Fria, passa a conviver com cenário mais complexo, redesenhado principalmente pelos cálculos da China. Oportunidade, portanto, para rever conceitos numa das regiões mais turbulentas do planeta.

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