Janio de Freitas

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Janio de Freitas

Psss, foi só mais um crime

As circunstâncias da morte de Marielle estão cada vez mais longe de resposta

Item de maior clamor na violência atual, as circunstâncias da morte de Marielle Franco estão, com o tempo, mais distantes da resposta que as investigações iniciais prenunciavam.

Não parece ser o caso de responsabilizar a polícia. Antes cabe reconhecer que o crime não foi obra apenas de matadores profissionais. A execução planejada e realizada com os requintes mais aguçados para estender o êxito do crime à frustração das investigações.

Mesmo o que aparente clarear alguns pontos pode ser ainda mais intrigante. Foi assim com as cápsulas de metralhadora incomum.

No presente estágio das perplexidades, assumiu relevância uma testemunha espontânea e não identificada que traz informações com nomes e pormenores precisos, como se fossem o relatório final de competente investigação.

Quem estava no carro dos matadores, quando e em que restaurante foi decidido o fim de Marielle, conversas que o informante assistiu ou de que até participou.

Grande presente. E gratuito, além de voluntário. Mas, se não suscitou indagações, ao menos indagações que chegassem às notícias, a aceitação do pacote é tão exótica quanto seu conteúdo. Cá entre nós, alguém daria pormenores que permitiriam sua fácil identificação pelos denunciados do crime, mandantes e executores? No que diz sobre o que viu e ouviu, o informante se identifica para ser o próximo executado.

Com esse testemunho original, surge no caso Marielle uma segunda investigação necessária: trata-se de saber se as informações são uma via ou um descaminho perturbador.

Talvez outra interrogação sem resposta, considerando-se que, no dizer recente de um delegado, esclarecer a morte de Marielle Franco exigiria abandonar muitas outras investigações. Precisamos pedir aos assassinos contumazes que, em atenção às dificuldades funcionais e materiais da polícia, diminuam temporariamente a sua produção.

Por outros motivos, é também interessante a falta de seguimento de um caso surgido de relance e desaparecido sem rastro no começo de maio. Não menos de 120 mandados judiciais de busca e apreensão buscaram, naqueles dias, comprovações da fraude cometida por ao menos 30 prefeituras de São Paulo.

Nelas, um cartel de cinco empresas fraudava os valores e o material para escolas. Sobretudo a merenda escolar, em que o leite pago era substituído por refresco, a carne por um ovo, o pão por uma bolacha.

Em 20 anos de licitações e fornecimentos fraudados, houve o desvio de ao menos R$ 1,6 bilhão de verbas escolares municipais. Roubar na alimentação de crianças é monstruosidade. Só na capital São Paulo, foram realizadas 13 buscas.

Em Araçatuba, por exemplo, dos R$ 3,2 milhões recebidos, em dois períodos, do Programa Nacional de Alimentação Escolar, R$ 2,2 milhões foram desviados.

A busca de documentos deu-se também em Brasília, Salvador e Curitiba, a pura. A Polícia Federal pediu a prisão de 62 pessoas, nem uma só autorizada pelo Judiciário. Não se sabe por que os pedidos, nem as recusas. Não se sabe de mais nada, sobre parte alguma desse crime revoltante, desde o começo de maio. Por quê, também não se sabe.

Também não se sabe, mas se sabe por que não se sabe, se a razia feita pelo delegado Gastão Schefer Neto, da PF, no acampamento de petistas em Curitiba custou-lhe algo. O policial resolveu acabar com o "bom dia, Lula", gritado às sete horas. Considerou-o cedo demais. É, porém, até para as mais barulhentas obras, a hora de término legal do silêncio obrigatório. Apesar dos dorminhocos.

Cinco dias antes, de madrugada foram disparados tiros contra os petistas acampados. Um mês antes, sempre no Paraná, houve disparos contra um ônibus da caravana de Lula pelo Sul. Era o ônibus dos repórteres.

Por aqui, não é preciso serem crimes refinados para serem crimes apagados.

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