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joão pereira coutinho

 

30/05/2011 - 07h00

Penas de vida

O que fazer com Ratko Mladic? Boa pergunta. Difícil resposta. O ex-general bósnio foi capturado pela polícia da Sérvia e deve ser agora extraditado para o Tribunal Penal Internacional, em Haia, onde será julgado.

Acusações: genocídio, crimes de guerra e crimes contra a Humanidade. No centro desse rol emérito está a responsabilidade de Mladic pelos acontecimentos em Srebrenica, 16 anos atrás.

Desde o fim da Segunda Guerra Mundial (1939 - 1945) que a Europa não assistia a um massacre assim: mais de 8 mil muçulmanos mortos pelos homens de Mladic e enterrados em valas comuns. As tropas da ONU nem pestanejaram.

Mas repito: o que fazer com Ratko Mladic? Recuando mais de meio século e revisitando os julgamentos de Nuremberg, que puniram com dureza os principais carrascos nazistas, o destino de Mladic seria óbvio: a pena de morte.

O Tribunal Penal de Haia não a aplica, eu sei. Mas a questão que interessa é outra: será que a deveria aplicar para punir os inomináveis crimes de Mladic?

Sou contra a pena capital. E sou contra pelos motivos inversos aos da maioria dos abolicionistas: o problema da pena de morte não está na sua dureza extrema; está, pelo contrário, no fato de ela não ser dura o suficiente.

Essa observação não é apenas uma resposta emocional à natureza de certos crimes; é uma observação que lida com os imperativos de "retribuição" e "restituição" que devem presidir a qualquer sentença judicial.

O filósofo Hugo Adam Bedau, um dos maiores pensadores modernos sobre a matéria, escreveu abundantemente sobre isso: a pena capital nada restitui e nada retribui.

Logicamente, não restitui as vítimas à vida --e pouco interessa se falamos de uma, de oito, ou de oito mil. De igual forma, e ainda no plano lógico, só seria sustentável defender a execução do criminoso se o ato trouxesse a sua vítima, ou as suas vítimas, de volta ao reino dos vivos.

Mas, talvez mais importante, a pena de morte nada retribui: a agonia da vítima é única e irrepetível. Nenhuma injeção letal, nenhum enforcamento, nenhuma eletrocução, nenhum pelotão de fuzilamento seria capaz de infligir em Mladic o cúmulo de dor ou agonia das suas vítimas.

Creio, aliás, que a morte de Mladic seria um insulto a elas. Não devem existir saídas fáceis para crimes medonhos.

Sou contra a pena de morte, sim. Mas, para um criminoso como Mladic, sou favorável a uma pena de vida: a condenação ao tédio e à repetição, em espaço confinado, exatamente como Dante imaginou o Inferno.

7.mai.93 - Reuters
O ex-general Radko Mladic em 1993
O ex-general Radko Mladic em 1993
joão pereira coutinho

João Pereira Coutinho, escritor português, é doutor em Ciência Política. É colunista do 'Correio da Manhã', o maior diário português. Reuniu seus artigos para o Brasil no livro 'Avenida Paulista' (Record). Escreve às terças na versão impressa e a cada duas semanas, às segundas, no site.

 

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