Joel Pinheiro da Fonseca

Economista, mestre em filosofia pela USP.

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Joel Pinheiro da Fonseca

O voto impresso é uma boa ideia?

Os céticos sobre as urnas eletrônicas são crédulos demais na segurança da apuração humana de cédulas de papel

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Vou ignorar o lado político e me ater aos méritos do voto impresso. A pergunta é: o voto impresso tornará nossas eleições mais seguras e transparentes? A resposta é não. E trará problemas adicionais.

Dois argumentos são utilizados a favor do voto impresso. Um deles vê com desconfiança a totalização dos votos que o TSE faz depois de receber os resultados das cerca de 500 mil urnas espalhadas pelo país. Esse receio é infundado.

Ao término da votação, cada urna já imprime um boletim com os votos de cada candidato. Se a totalização do TSE divergisse da soma desses boletins impressos, seria facílimo de mostrar. Até hoje, nunca aconteceu.

Canhoto impresso saindo de máquina
Teste de modelo de urna eletrônica com sistema de impressão, antes da eleição de 2002, em Brasília - Bruno Stuckert - 11.abr.2002/Folhapress

A dúvida legítima é quanto à segurança de cada urna individual. Será que ela está contabilizando os votos corretamente? Ao contrário da totalização feita pelo TSE, essa contagem de cada urna não pode, atualmente, ser conferida de forma independente.

O voto impresso daria uma possibilidade de recontagem que não depende do que a própria urna diz. O problema é que os defensores do voto impresso, tão céticos quanto à segurança da urna eletrônica, são crédulos demais na segurança da apuração humana de milhões de cédulas de papel. O Brasil tem longa experiência com a apuração manual: processo demorado e sempre sujeito a fraudes, que de fato ocorriam.

É possível hackear as urnas eletrônicas? Teoricamente sim. Até hoje, contudo, ninguém conseguiu. Há mais de 30 camadas de segurança, e a Justiça Eleitoral realiza testes periódicos. O código-fonte do programa das urnas é plenamente auditável. Seriam necessários hackers agindo em milhares de urnas uma a uma, posto que elas não estão conectadas à internet e nem entre si.

É mais fácil fraudar a apuração manual do que hackear as urnas eletrônicas. Ou seja, o método para conferir o voto eletrônico é menos confiável que o próprio voto eletrônico. Adicionou-se um elo à corrente, mas esse elo é mais fraco.

Quem tem dois números não tem nenhum. Se houver discrepância entre o eletrônico e o papel, o que acontece? Não saberemos se o problema estava na urna eletrônica ou na contagem dos papeizinhos.
Pela lógica, teríamos que ficar com o eletrônico, mais seguro, e descartar o papel (ou seja, a recontagem no papel seria inútil). Na prática, é claro, teremos o palco armado para a judicialização e a incerteza, com toda a instabilidade que isso traz.

Os defensores do voto impresso respondem que essas cédulas impressas serão mais seguras que as velhas cédulas manuais, pois terão certificação digital. Ora, mas então essa mudança nas eleições só vai transferir nossa "fé" do sistema da urna eletrônica para o sistema de certificação digital das cédulas, ambos igualmente inacessíveis aos olhos do cidadão.

Quem duvida sem provas das urnas eletrônicas também poderá duvidar da certificação eletrônica que garante a idoneidade das cédulas impressas.

As eleições brasileiras funcionam muito bem. A votação é rápida, a apuração ocorre no mesmo dia. Não há qualquer indício de que fraudes na urna eletrônica jamais tenham ocorrido. Todas as alegações em contrário são falsificações, como as mostradas por Bolsonaro em sua live.

Se os deputados aprovarem o voto impresso, teremos uma votação mais demorada (mais passos para o eleitor, mais problemas técnicos das impressoras), mais cara (custo de impressoras, técnicos, apuradores e sistema de certificação) e mais passível de contestações, sem ganho relevante de segurança.

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