Joel Pinheiro da Fonseca

Economista, mestre em filosofia pela USP.

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Joel Pinheiro da Fonseca

No mercado das ideias, as melhores vencem?

Notícia que confirma visão de mundo do leitor é aceita de pronto, enquanto a que a contradiz irrita

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Para que um debate público minimamente realista e produtivo ocorra, é preciso que as pessoas sejam alimentadas com informações corretas.

No passado, uma estrutura cara —e imperfeita— composta de checagem, treinamento profissional, códigos de conduta e reputação dava uma garantia de qualidade mínima à informação veiculada pela imprensa. As grandes empresas que dominavam o mercado faziam um trabalho de filtragem do que chegava ou não chegava ao grande público.

Hoje, os meios de divulgação, antes caros, se tornaram triviais. Qualquer pessoa com acesso à internet pode fazer perfis gratuitos nas redes sociais e veicular suas ideias. Qualquer um com conhecimento básico de edição de texto e imagem pode criar suas “notícias”, verdadeiras ou falsas, e difundi-las. O poder de filtragem da imprensa —cuja estrutura continua cara— caiu por terra.

O mercado é excelente para entregar às pessoas o que elas querem, sem juízos de valor, de comida a notícias. Num mercado de livre concorrência, os milhares ou milhões de fornecedores competirão para entregar notícias, opiniões e ideias que melhor satisfaçam o desejo dos consumidores. Isso significa que as melhores ideias vencerão? Será o mercado de ideias, por si mesmo, o melhor filtro para separar o verdadeiro do falso?

Isso aconteceria se o principal objetivo das pessoas ao consumir informação fosse conhecer a realidade. Infelizmente, sabemos que não é assim. O desejo de pertencer a um grupo e de confirmar as próprias crenças e valores muitas vezes fala mais alto.

Logo do Facebook em impressão 3D ao lado de pequenas figuras humanas de brinquedo e um teclado
Logo do Facebook em impressão 3D ao lado de pequenas figuras humanas de brinquedo e um teclado - Dado Ruvic/Reuters

A notícia que confirma a visão de mundo do leitor é aceita de pronto —dá até vontade de sair compartilhando por aí antes mesmo de checar—, já a que a contradiz o deixa irritado, exige de sua mente o esforço necessário para explicar, descontar ou desqualificar aquela informação que agride sua psique.

Como nenhum lado é dono da verdade, sempre haverá dados da realidade que contradizem o que gostaríamos que fosse verdade, seja qual for nosso grupo. Sendo assim, qualquer jornal sério irá fatalmente desagradar todos os leitores em algum momento.

Já o jornalista amador que mistura reportagem com opinião e sempre dá um jeito de dizer que um lado está certo e de atribuir as piores intenções aos adversários, esse terá clientela satisfeita. Com cada lado do espectro se fechando ao redor de suas fontes favoritas, o resultado é o fim progressivo de um chão comum de informações que possibilite o debate público. Sobram apenas as mostras de força.

Bolsonaro foi, no Brasil, o primeiro a explorar as potencialidades das redes sociais e aplicativos de mensagens (algo que o PT já ensaiara na época dos blogs, mas com muito menos penetração) para criar seu mundo paralelo. Ele não é, contudo, a causa do problema. Movimentos e políticos muito diferentes dele poderão ter a mesma proficiência das redes no futuro. Assim como nas drogas e nas junk foods, o problema está na demanda.

O gosto sem freios dos consumidores no setor da alimentação gerou a obesidade generalizada. Aos poucos criamos normas e promovemos conscientização para uma alimentação mais saudável. Algo similar é necessário na produção e consumo de informação.

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