Joel Pinheiro da Fonseca

Economista, mestre em filosofia pela USP.

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Joel Pinheiro da Fonseca

Lula e PT não conseguem defender a democracia

Partido é contra ditaduras; desde que sejam de direita

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Enquanto Lula era recebido com honras pelos líderes das principais democracias europeias, Bolsonaro fazia um tour por ditaduras árabes. O contraste traz saudades da projeção internacional que já tivemos e que perdemos com o desastre bolsonarista.

Mas ele não nos deve cegar para o outro lado, menos vistoso, da política internacional de Lula e do PT: o apoio reiterado a ditaduras de esquerda, bem como a governos populistas que empurram seus países nessa direção.

Lula durante evento em Brasília - Ueslei Marcelino-8.out.21/Reuters

Há duas semanas tivemos a nota de celebração à vitória de Daniel Ortega na Nicarágua em eleições fraudulentas. Para o PT, tratou-se de "uma grande manifestação popular e democrática", ecoando, aliás, o apoio às eleições de fachada na Venezuela em 2020. A nota foi deletada posteriormente, mas nenhuma mudança de postura veio.

Não é caso isolado. A cada nova fala sobre política internacional, o problema reaparece. Em agosto, em entrevista a um canal mexicano, Lula se restringira a dar um "conselho" a Ortega: não abrir mão da democracia. Dar esse conselho a um ditador que vem há anos destruindo a liberdade de imprensa e que chegou mesmo a prender seus adversários políticos é o mesmo que recomendar a Bolsonaro, em 2021, que não faça rachadinha.

Em entrevista ao El País da Espanha, no sábado, Lula se mostrou ainda mais receptivo ao governo Ortega: "Por que Angela Merkel pode ficar 16 anos no poder, e Daniel Ortega não?", ignorando que a Alemanha tem liberdade de imprensa e eleições limpas.

Na mesma entrevista, falou de Cuba. Lula evita elogiar diretamente aquela que é a pior ditadura das Américas na atualidade, mas reproduziu o discurso do próprio regime: os males da ilha, incluindo a falta de democracia, devem-se ao embargo americano. Nada sobre a responsabilidade do governo cubano e de seus aliados.

Nesta segunda (22) foi a vez de Dilma, que louvou o Estado totalitário chinês. "A China representa uma luz nessa situação de absoluta decadência e escuridão que é atravessada pelas sociedades ocidentais", disse ela no evento de lançamento de um livro. É, temos um padrão.

O PT é contra ditaduras; desde que sejam de direita. Se forem de esquerda, o máximo de dureza serão reticências discretas, quando não afagos. Esse alinhamento não é inofensivo. A degeneração das instituições democráticas promovida em nome de um discurso de esquerda é um caminho perfeitamente possível em nosso contexto. Aconteceu na Venezuela, acontece na Nicarágua e na Argentina. E pode acontecer aqui.

Não haveria nada mais simples do que se colocar clara e inequivocamente contra ditaduras: "Democracia é um valor inegociável, e mesmo o bem-estar social e combate à pobreza ocorrem melhor em um ambiente democrático e com liberdade de imprensa. Ortega, Maduro e Diaz-Canel têm que deixar o poder". É o que faz Mujica no Uruguai. Uma fala simples dessas, aliás, já lhe traria ganhos com a opinião pública, que não nutre mais as miragens socialistas da Guerra Fria. O fato de não se posicionar dessa maneira é sinal de que uma parcela importante de sua base de apoio acredita justamente nesse caminho e provavelmente espera voltar a cooperar com os piores regimes do continente, e quem sabe repetir sua receita aqui. O controle social da mídia é um passo nessa direção.

Lula busca eleitores moderados e nos fazer sonhar com um Brasil respeitado mundialmente. Continua, contudo, a cultivar laços com os piores regimes do nosso continente e do mundo. Dá para acreditar em seu compromisso com a democracia?

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