Joel Pinheiro da Fonseca

Economista, mestre em filosofia pela USP.

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Joel Pinheiro da Fonseca
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Estamos longe de conciliar liberdade de expressão e combate à desinformação

Poder dado pelas redes sociais traz alguns riscos à própria ordem social

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Ainda estamos longe de equacionar redes sociais e liberdade de expressão. Uma das apostas, a de que as próprias empresas que controlam as redes façam sua autorregulação, mostrou pontos fracos nos últimos dias.

As redes sociais deram o poder equivalente ao de um canal de TV ou estação de rádio nas mãos de cada indivíduo. Associado à liberdade de expressão, valor inegociável do mundo democrático, esse poder, além das enormes oportunidades que oferece a cada um de nós, traz também alguns riscos à própria ordem social.

Teorias da conspiração em larga escala, polarização extrema, fanatização e incitação ao terrorismo, desinformação sobre temas de vida ou morte (como a pandemia) e corrosão das normas da convivência democrática fazem parte do pacote.

Ícone do WhatsApp em um smartphone - AFP

Visando combater isso, o WhatsApp, em 2019, limitou a função de encaminhar mensagens a 5 destinatários por vez. Em 2020, nova restrição: conteúdos muito compartilhados só poderiam ser encaminhados a um destinatário de cada vez. Nada te impede de repetir o mesmo comando inúmeras vezes para enviá-lo a dezenas de pessoas, mas só a chatice e o tempo perdido já desestimulam muita gente.

É um tipo de restrição curioso, porque ele diminui justamente o grande atrativo de uma rede ou aplicativo de mensagens: seu poder de difusão. É como se uma empresa de megafones reduzisse os decibéis máximos de seu aparelho. O problema é que outras empresas estão aí vendendo megafones mais potentes.

Sem dúvida foi por isso que o WhatsApp decidiu lançar a nova função de "comunidades", que permitirá grupos de milhares de pessoas, superando em muito o limite atual de 256 membros. Ao fazer isso, faz frente ao Telegram, seu concorrente, que já permite grupos enormes e é campo fértil para disseminação rápida de conteúdos em larga escala (para o bem e para o mal), sem nenhuma moderação.

Que a mudança só seja implementada no Brasil depois do segundo turno, conforme acordado com o TSE, apenas a torna mais suspeita. Primeiro porque é quase uma admissão tácita da própria empresa de que a novidade traz riscos à democracia. Se é assim, então por que trazê-la? E todo o comprometimento da Meta (empresa dona do WhatsApp e do Facebook) com a sustentação de valores democráticos e combate às fake news?

E segundo porque ficou parecendo que o objetivo dessa espera é única e exclusivamente prejudicar a campanha do Bolsonaro, que é quem mais se beneficiaria de serviços de mensagem mais potentes. Se o beneficiário esperado fosse Lula ou algum outro candidato, teríamos a mesma preocupação? Esse tipo de parcialidade é no mínimo difícil de equacionar com instituições sérias.

Mesmo que se chegue a regras justas e imparciais, quem garante que elas valerão pelos próximos anos? Nada é mais fluido que os impérios no meio digital. A rede promissora de um dia é um cemitério no próximo. E as políticas empresariais mudam também. Na semana passada Elon Musk ameaçou de comprar o Twitter e mudar sua política de moderação de conteúdo. Seria perfeitamente possível e totalmente legal.

Em meio às dificuldades de se chegar a regras —estatais ou empresariais— que moderem os piores aspectos das redes, cabe perguntar: por que a liberdade nas redes é automaticamente vista como auxílio a movimentos extremistas e jamais para democráticos? Mais importante do que limitar os novos poderes que a tecnologia trouxe ao homem comum, não seria aceitá-los e aprender a usá-los para o bem?

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