Joel Pinheiro da Fonseca

Economista, mestre em filosofia pela USP.

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Joel Pinheiro da Fonseca

A defesa da democracia exige votar em Lula?

Votar no petista no primeiro turno em nada diminuiria as chances de um golpe

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Com a desistência de João Doria, as opções vão se afunilando. Não é um bom momento para ser de "terceira via". Ridicularizados por todos os lados, apoiadores de candidatos sem voto. O único motivo para continuar nesse campo é a crença num Brasil melhor. E, mesmo assim, não falta quem tente nos assediar a optar por um dos dois líderes das pesquisas.

Vozes imperativas vêm do lado petista, decretando que esta eleição é um plebiscito sobre a democracia. "Quem não votar em Lula já no primeiro turno não liga para a democracia". E não são só militantes do PT ecoando esse discurso. Há pessoas de centro e até liberais.​

O ex-presidente Lula (PT) - Marlene Bergamo/Folhapress

O argumento dos que defendem voto em Lula "pela democracia" é o seguinte: Bolsonaro é um autoritário disposto a dar um golpe se perder. Lula é o favorito para vencer nas urnas. No entanto, se essa vitória se der em segundo turno, aumentam as chances de Bolsonaro conseguir arregimentar sua base e as Forças Armadas para dar o golpe.

Se Lula vencer já no primeiro turno, dizem, Bolsonaro teria de contestar o resultado das mesmas urnas que elegeram os deputados e senadores. Estes, por sua vez, não embarcariam na narrativa golpista, pois ela colocaria seus mandatos em dúvida.

Essa tese tem um pequeno probleminha: considera impossível uma conduta que Bolsonaro e seus aliados já têm cotidianamente. Desde março de 2020, Bolsonaro diz, abertamente, que o primeiro turno das eleições de 2018, que ele venceu, foi fraudado. E os deputados de sua base concordam com ele.

Pela lógica, desacreditar as eleições que os elegeram deveria desacreditar também a legitimidade de seus mandatos. Mas quem disse que a lógica importa nesse caso? Toda a narrativa contra as urnas brasileiras é baseada em mentiras descaradas e carece de qualquer lógica. Ela não é feita para ser levada a sério; é só um pretexto usado para descredibilizar as eleições, que vale enquanto for conveniente e será descartado se não for.

Há que se considerar, ademais, o realismo desse possível golpe. As bravatas de Bolsonaro —buscando minar a credibilidade das urnas— são graves por si só. Mas não constituem uma ameaça real e iminente à democracia. Está claro que, caso perca, ele estimulará uma arruaça geral. É algo seríssimo, que pode inclusive resultar em mortes (como ocorreu nos EUA), mas que está longe de ser um golpe de Estado bem-sucedido.

Para um golpe, seria preciso a participação das Forças Armadas. E se os generais e tropas brasileiros realmente quiserem contrariar o resultado das urnas, não é o dia do mês que mudará seu propósito e nem faltariam desculpas fajutas para justificá-lo.

Com eles estariam todos os deputados que esperam sugar mais um pouquinho de recursos da República com Bolsonaro na presidência, e também as massas fanatizadas pelo discurso do Mito, sem nenhuma necessidade de coerência. As semanas que se seguirem à derrota —seja no primeiro turno, seja no segundo— serão dedicadas a fomentar a mobilização popular da mesma maneira.

Não, a defesa da democracia não exige o voto em Lula. Ele não era exemplo de democrata quando pagava mesada para deputados votarem com o governo e não é nossa última esperança agora.

Seria tão bom para o Brasil colocar um outro nome no segundo turno contra Lula! Daí teríamos uma disputa sem chantagem, sem o espectro do "fascismo" que justifica qualquer excesso. Não há intimidação moral ou medo de golpe que me impeça de escolher o melhor.

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