Reunidos em torno de suas vaidades, um engenheiro, um padre, um médico e um advogado discutiam sobre quem, entre eles, seria mais importante para a sociedade. A conversa girava em torno de uma palavra em alta na bolsa de valores do noticiário cotidiano: o caos.
A lógica era simples. Sairia vencedor quem melhor demonstrasse controlar esse caos. O engenheiro, muito prático, se apressou tomando a palavra: "Nós controlamos o caos da natureza, a maior importância é essa". "Nem pensar", surgiu o médico, convicto da superioridade de seus humores. "Mais importantes somos nós, os que controlam o caos do corpo humano. Sem ele a humanidade não existiria." O padre, indignado, irrompe em um transe crente, brandindo sua fé. "Os mais importantes somos nós, os que cuidam do caos da alma, sem uma alma serena todos vão arder para sempre no inferno."
No final, usando da milenar sapiência que aconselha a falar sempre em último lugar, o advogado esperou tranquilamente que a acalorada discussão terminasse. Então levantou-se solenemente e, com formalíssima dignidade, disse: "Nós somos os mais importantes. Como nós inventamos o caos, apenas nós o poderemos controlar".
Estudante na universidade, ouvi vezes sem conta essa história da boca de um mestre, o professor Avelãs Nunes, catedrático da histórica Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, demonstrando, a contrariu sensu, a vantagem do uso da palavra sobre a ação e da inteligência sobre a força.
Os advogados! Apesar de muitas vezes amaldiçoados, culpados pelas burocracias com que nos desesperamos, a verdade é que, sem eles, sempre que o conflito —essa mais que frequente qualidade do ser humano— irrompe em nossas vidas, estaríamos perdidos. Nós como indivíduos, mas sobretudo a sociedade como um todo.
Nesta quinta, 11 de agosto, o Brasil celebra o dia dos advogados em um contexto muito especial. À semelhança do que aconteceu em 1977, o largo São Francisco, bem no centro de São Paulo, surge de novo como lugar importante para a democracia brasileira.
Todos esperam que, como naquele momento tão importante no processo de redemocratização, faz agora 45 anos, desde as arcadas do largo, no território lLivre da Academia de Direito de São Paulo, de novo os advogados dirijam a todos os brasileiros uma proclamação de princípios de sua convicção política.
Que, de novo, na qualidade de herdeiros do patrimônio recebido de seus maiores, no ensejo do 195º ano dos cursos jurídicos no Brasil, deem testemunho, para as gerações futuras, de que os ideais do Estado de Direito, apesar da conjuntura da hora presente, vivem e atuam, hoje como ontem, no espírito vigilante da nacionalidade.
Nesta quinta, dia 11 de agosto, os advogados brasileiros, históricos defensores da democracia, estarão, de novo, na linha da frente, e o seu exemplo terá uma visibilidade internacional, mostrando ao mundo que, apesar da burocracia, ou talvez por causa dela, a OAB é um poderoso garante da liberdade e uma marca de modernidade do Brasil.
Neste mundo hiperconectado, volátil, incerto, complexo e ambíguo, poluído por whatsapps descontrolados, gabinetes de ódio e fake news, e onde o caos ganha diariamente novas e inesperadas formas, serão, de novo, os advogados a classe mais bem preparada para ajudar a sociedade a encontrar novos equilíbrios que garantam a sobrevivência da democracia no futuro.
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