José Manuel Diogo

Diretor da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Brasileira, é fundador da Associação Portugal Brasil 200 anos.

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Onde se fala português Portugal

Portugal e Brasil precisam resolver diferenças culturais

Conflitos de que ouvimos falar são menos relevantes do que sensacionalismo de jornais e likes nas redes

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Quando me pedem que fale sobre a minha experiência entre "o cá e o lá", começo sempre a "palestra" citando um clássico da antiguidade, o filósofo grego Sócrates: "Pior que a ignorância é a ilusão do conhecimento".

Uma das primeiras coisas que digo aos portugueses que se mudam para o Brasil e aos brasileiros que vão morar em Portugal é para terem cuidado em não fazer assunções baseadas no fato de que nos dois países se fala a mesma língua.

Estudantes brasileiros protestam na entrada da faculdade de direito de Lisboa
Estudantes brasileiros protestam na entrada da faculdade de direito de Lisboa - Giuliana Miranda - 20.abr19/Folhapress

Na verdade, a língua não é a "mesma". Embora muitas palavras sejam iguais (sua forma lida e grafada coincide a maior parte das vezes) e o idioma oficial dos dois países seja o português, muitas vezes, presumir que em Lisboa e em São Paulo todos se entendem, independentemente de quem está cá ou lá, é um erro de palmatória.

Essa "ilusão" está na origem dos maiores problemas que essa nova era de migrações entre Brasil e Portugal está provocando. Eles se escondem na aparente proximidade, mas representam a distância e se tornam evidentes apenas quando eclodem, normalmente com pública virulência.

Ainda não foi criada vacina para esses problemas e o único remédio que os atende seria a criação de um programa bilateral dirigido a resolver as diferenças culturais entre os dois países que se vão tornando mais notórias à medida que a convivência inclui mais pessoas.

Portugal não esconde que precisa de pessoas, que prefere os brasileiros mas tem de preparar-se com seriedade para isso ao nível das políticas e da comunicação.

Deveria investir em um programa cultural destinado a garantir um conhecimento sistemático e profundo da cultura e das artes portuguesas, que no Brasil, são praticamente desconhecidas. Isso seria recomendável, até para diminuir o sentimento de desequilíbrio gerador de desconfianças.

O inverso também se aplica. Certo que colonizador e colonizado são antagonistas naturais, mas quando a situação se inverte, como agora, com o crescimento exponencial da emigração para o país luso, é igualmente preciso que Portugal e os portugueses conheçam melhor os hábitos e cultura dos seus irmãos do lado de cá.

A distância do oceano que separa os dois países —imenso e desconhecido no tempo das caravelas; distante, mas porto seguro para realezas fugitivas nos alvores da independência; desafio de inovação tecnológica e superação no momento da travessia aérea de Sacadura Cabral e Gago Coutinho— não desapareceu só porque passaram a existir youtubers bilíngues, instagrams de celebridades ou seções nos veículos de mídia portugueses destinadas a explicar as oportunidades ou amplificar as diferenças conforme o interesse de cada ocasião.

Essa nova realidade está mudando de fato a vida das pessoas, mas também criando, sobretudo ao governo de Lisboa, problemas novos para os quais ainda não há solução.

Muitos dos episódios de conflito de que ouvimos falar –problemas nos aeroportos, a lentidão da atribuição dos vistos ou mesmo casos (muito esporádicos) de racismo e violência— são sempre menos relevantes do que o sensacionalismo que vende os jornais e ganha likes nas redes sociais.

Também nesses casos a ilusão do conhecimento deve ser contrariada. Precisamente dando a conhecer as diferenças da língua e da cultura, de "cá e de lá", para que, em conjunto, portugueses e brasileiros possam encontrar o maior denominador comum em suas maravilhosas semelhanças.

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