Juca Kfouri

Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP.

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Juca Kfouri
Descrição de chapéu fifa Futebol

Abaixo o futebol perfeito

Jornalista britânico fica contra vídeo-arbitragem com argumentos do humor inglês

Árbitros de vídeo em jogo entre Nice e Monaco pela Copa da Liga Francesa, em janeiro de 2018
Árbitros de vídeo em jogo entre Nice e Monaco pela Copa da Liga Francesa, em janeiro de 2018 - Valery Hache/AFP

Recente artigo da revista inglesa "The Spectator" aborda a vídeo-arbitragem (VAR) com o sabor do peculiar humor daquelas bandas britânicas.

"Quando o árbitro não tem certeza sobre algum acontecimento crucial no campo, ele convoca outro árbitro por meio de um fone de ouvido para ajudá-lo.

O outro árbitro está a muitas milhas de distância, assistindo à partida na televisão.

O árbitro paralisa o jogo e vai dar uma olhada numa tela de vídeo ao lado do campo.

E ele e o outro árbitro, a todas essas milhas de distância, falam sobre o que veem por dois ou três minutos, enquanto a torcida fica entediada e a dinâmica do jogo se perde. Então, ele toma a decisão: errada!

Ou talvez, quem sabe, a decisão certa. Uma decisão, enfim."

Segue o articulista Rod Liddle, equivocado na humilde opinião deste que vos escreve, mas divertido: "Acho que, em breve, as dúvidas serão levadas para um painel de especialistas.

Ou, talvez, para um Tribunal Internacional de Justiça.

Ou, ainda, em dia não muito distante, para representantes de Jesus Cristo, Buda, Maomé, todos colados a uma TV em um quarto de hotel em algum lugar, discutindo sobre se o talentoso, ou histriônico, atacante Mohamed  Salah, do Liverpool, mergulhou ou foi derrubado na área: 'Falta clara no meu livro', diz Maomé enquanto pega um salgadinho. 'Bobagem, você está sendo tendencioso', responde Cristo, terminando sua lata de cerveja."

E prossegue o jornalista: "Porque, na verdade, é disso que se trata, é isso que o VAR realmente é: por um jogo, se transforma em deus substituto, com poderes acima dos mortais.

É um apelo à onipotência porque, hoje em dia, muito dinheiro está envolvido no futebol para as decisões serem tomadas por apenas um solitário ser humano.

As autoridades do futebol querem eliminar as dúvidas da vida. Só que sempre haverá dúvidas e não é um segundo homem com uma TV que mudará isso.

Nem que olhe as coisas em câmera lenta, porque o jogo não é jogado em câmera lenta, a menos que você seja um fã do Manchester United.

O movimento lento geralmente faz com que os carrinhos, as entradas por trás, pareçam muito piores do que realmente são, não importa quão experiente seja o observador.

Estão tentando fazer o futebol perfeito, apesar de tantos de nós saborearmos suas imperfeições tanto quanto gostamos da sua habilidade, de sua magia.

Sim, nós podemos nos relacionar com as imperfeições do futebol porque também temos as nossas."

Por fim, apela: "Parem de tentar fazer o futebol perfeito: seus erros é que o fazem tão divertido".

Desnecessário repetir: apesar da graça do autor, que só faltou gritar "ódio eterno ao futebol moderno!", o VAR chegou para ficar após resistir durante anos ao conservadorismo.

Sem deixar de dizer que, para muitos, o futebol é o esporte mais popular do planeta exatamente por recusar as novidades e a ânsia por justiça.

O esporte não foi feito para ser justo, dizem, mas para ser emocionante.

Eis o desafio do VAR: fazer da espera pela decisão do tal deus instantes tão emocionantes como aqueles antes da cobrança de um pênalti.

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