Juca Kfouri

Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP.

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Juca Kfouri

Não bastasse o capitão Neymar na seleção, corremos risco de outro na eleição

Nenhum sentimento anti justifica tamanha ameaça à democracia brasileira

São Paulo

É praticamente certo termos um ex-capitão no segundo turno da eleição.

Dia desses, aqui, se comentou o tamanho do erro de Tite em dar a Neymar, definitivamente, a faixa de capitão.

Ora, uma seleção que teve Hideraldo Luís Bellini, em 1958; Mauro Ramos de Oliveira, em 1962; Carlos Alberto Torres, em 1970; e Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira, em 1982, todos líderes natos e exemplares, não deveria dar tamanha responsabilidade simbólica ao Peter Pan.

A coluna, publicada no último dia 9 de setembro, ainda citava a dupla Dunga e Cafu, os dois capitães do tetra e do pentacampeonato, em 1994 e 2002, para fechar o quinteto composto por Bellini, Mauro e Carlos Alberto.

Houve leitor que protestou por não considerá-los à altura do trio mais antigo, embora fosse inegável o poder de liderança de ambos e o respeito despertado entre seus companheiros.

O deputado Jair Bolsonaro (PSL) responde a perguntas em sabatina do jornal Correio Braziliense
O deputado Jair Bolsonaro (PSL) responde a perguntas em sabatina do jornal Correio Braziliense - Pedro Ladeira/Folhapress

A história do Brasil registra um outro capitão com C maiúsculo: Luís Carlos Prestes.

Você, rara leitora, raro leitor, pode concordar ou discordar de seus sonhos e ideias --leia a biografia "Luís Carlos Prestes, um revolucionário entre dois mundos", de autoria do historiador Daniel Aarão Reis, pela Companhia das Letras.

Inegável o papel por ele desempenhado como um dos protagonistas brasileiros no século passado e o alto preço pago por não arredar pé de suas convicções.

Cabe dizer ser tão grande a diferença entre Prestes e o nefasto capitão reformado como é enorme a entre Sócrates e Neymar.

O problema está nos possíveis males que um e outro podem causar, o craque apenas no futebol, o outro no país.

O simples fato de tantos eleitores estarem dispostos a votar nele revela o baixo estágio civilizatório do Brasil.

Qualquer outro candidato, até mesmo o amalucado cabo, é melhor, pelo menos por não fazer apologia da tortura e outras violências.

Nenhum sentimento anti, por mais motivos que haja, justifica tamanha ameaça à democracia brasileira, atacada, também, pela toga eleitoreira e censora.

Mal comparando, o torcedor anticorintiano, por exemplo, torce contra, mas não chega ao absurdo de desejar a queda do avião do arquirrival.

Assustador, também, ver ponderáveis setores da elite nacional, e articulistas, imaginarem o ex-militar como mal menor para a democracia.

​Porque com todas as críticas possíveis aos governos pós-ditadura --agora chamada de "movimento" por um presidente do STF, reprovado em dois exames para juiz de 1ª instância e responsável por uma das inúmeras, e justas, críticas ao governo apeado que o nomeou--, ameaças à democracia não houve.

Nem censura à imprensa ou violência contra jornalistas, como já cometida pelo candidato em primeiro lugar nas pesquisas.

Não pode haver tolerância com a intolerância de quem proclama o coronel torturador Brilhante Ustra como herói

Nem para tomar um cafezinho com os autores de tamanha monstruosidade, que dirá até para elegê-los como síndicos --e são dois os autores, o ex-capitão e o general de pijamas em sua chapa.

Porque a tolerância com a intolerância significa a vitória da segunda e o fim da primeira.

Outra vez guardadas as devidas proporções, votar numa dupla dessas é como torcer pela volta da seleção alemã ao Brasil para ganhar de 14 a 1.

Não, não! Mil vezes não!

É muito, mas muito, incomparavelmente pior.

Esqueça o péssimo exemplo.

​E vote em qualquer um. Nele, não!

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