Juca Kfouri

Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP.

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Juca Kfouri

Encenação de dirigentes do Flamengo beirou o surreal

Dez meninos morreram queimados, e até hoje o clube não solucionou a tragédia

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Como estão as famílias do acidente com o voo da Chapecoense?

E as da tragédia em Brumadinho?

Estão como estão seis e meia das famílias dos dez garotos que morreram carbonizados no centro de treinamentos do Flamengo no dia 8 de fevereiro do ano passado --neste sábado fará um ano.

Lembremos: a queda do avião assassino na Colômbia, que estava em situação totalmente irregular, aconteceu no dia 28 de novembro de 2016 e matou 71 pessoas; a destruição de Brumadinho, por desleixo dos responsáveis da Vale, deu-se em 25 de janeiro de 2019, e deixou 270 mortos.

Nos três casos, as famílias que fizeram acordos não tiveram outra saída por estarem com a corda no pescoço; a direção da Chapecoense, alvo da empatia mundial, nunca mais agiu como dela se esperava; até empresas que perderam jornalistas, como a Fox, são objeto de ações na Justiça até hoje; e a Vale gasta milhões em campanhas na TV para tentar explicar o inexplicável, mas não zera a conta como seria obrigatório.

Porque os executivos à frente da Chapecoense, da Vale e do Flamengo não estão preocupados com os que morreram e, sobretudo, com os que dependiam dos que morreram, seja porque perderam seus arrimos de família, seja porque, no caso das crianças rubro-negras, significavam a esperança de dias melhores.
A vida parece não valer nada diante do dinheiro.

O pronunciamento de três cartolas da Gávea no último sábado (1º), feito na TV Fla com perguntas evidentemente sob medida, causou a chamada vergonha alheia, para não dizer asco. Frieza pouca é bobagem.

Do presidente do clube, Rodolfo Landim, ao CEO Reinaldo Belotti, passando pelo vice jurídico, Rodrigo Dunshee de Abranches, a encenação beirou o inacreditável, o surreal.

Em vez de receberem a imprensa para uma verdadeira entrevista, preferiram se esconder por meio de pronunciamento encomendado e falsa seriedade, em demonstração de insensibilidade raramente vista até mesmo no sujo mundo do futebol.

Dos responsáveis por armazenar crianças em contêineres da gestão passada, aos atuais cartolas, o que se vê é a busca desesperada em se eximir, tirar o corpo, numa aposta mórbida em que as vitórias no campo apagarão a exigência de justiça e de indenizações.

Dessas situações em que se tem vergonha de fazer parte da mesma geração de tais seres que se parecem com os humanos, mas pouco têm a ver com estes.

Longe de achar que a situação é de fácil resolução, porque não é.

Mas bastaria agir com transparência e, sobretudo, com convincentes gestos solidários, por meio de comunicação permanente com as famílias e com a sociedade, para angariar a compreensão de todos e encaminhar a solução com a rapidez que o caso exige.

Porque o Flamengo não é a Chapecoense, com todo respeito, e muito menos é a Vale.

São dezenas de milhões de brasileiros ofendidos e preocupados com o despreparo gerencial do clube para tratar de tema tão delicado.

Está nas mãos da diretoria do Flamengo impedir que 2019 fique marcado não como o ano do heptacampeonato brasileiro, e do bicampeonato da Libertadores, mas como o das dez mortes no Ninho do Urubu.

Deixem o futebol nas mãos de Jorge Jesus porque ele tem mostrado que sabe como tratá-lo ao lado do vice-presidente da área, Marcos Braz.

E tratem o caso das famílias como a prioridade número um para tirar tamanha mancha do manto sagrado.

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